No dia 06 de julho de 1930 – a exatos 90 anos -, por volta das cinco horas da manhã, um aviãozinho Teco-teco, sobrevoou Princesa, inicialmente em voo rasante, despejando sobre a cidade um panfleto que concitava a população da cidade a abandoná-la e aos guerreiros do coronel José Pereira Lima a deporem as armas. A desobediência a essa intimação, dizia o Boletim, seria punida com a pena de ser o burgo, dentro de 24 horas, bombardeado pelos aeroplanos da polícia paraibana. Dizia o Panfleto:
“Aos rebeldes sertanejos – O Governo da Paraíba intima-vos a entregar as vossas armas. Vossas vidas serão garantidas, dando o governo liberdade aos que não respondam por outros crimes. Convém ouvir a palavra do governo. Deveis apresentar-vos aos nossos oficiais. Dentro de vinte e quatro horas, Princesa será bombardeada pelos aeroplanos da polícia, e tudo será arrasado. Evitai o vosso sacrifício inútil. Ainda é tempo de salvar-vos. Não vos enganeis; vossos chefes estão inteiramente perdidos”.
O Boletim redigido pelo comandante do estado Maior da Polícia paraibana, José Américo de Almeida, sediado em Piancó, e que foi despejado dos céus pelo avião “Garoto”, pilotado pelo aviador italiano Peroni, começou voando baixo, mas logo tomou altura em face do tiroteio desfechado pelos Libertadores de Princesa, empiquetados em vários pontos da cidade rebelada. Após a passagem do avião, o coronel Zé Pereira reuniu seu Estado Maior e tranquilizou a todos, informando da total impossibilidade de a polícia da Paraíba bombardear Princesa, que isso era uma falácia com o intento de amedrontar a população e, imediatamente, convocou o chefe do telégrafo, Richomer Barros, e ditou para este o seguinte telegrama, que foi despachado para o palácio do governo na capital paraibana:
“Famílias de Princesa, em conselho, resolveram transmitir a V. Excia. O seguinte despacho – Aguardamos, abnegados, o bombardeio de Princesa. Prevenimos, entretanto, que ao invés de nos entregarmos a oficiais sequazes, vandálicos que executam, inconscientemente, truculentos desígnios de V. Excia., delinquentes profissionais como Clementino Quelé, João Costa, Zé Guedes e quejandos, aconselhamos os Libertadores a conflagrar o Estado, visando assim aos mesmos processos que caracterizam o governo de V. Excia.”.
Como bem disse o Coronel, o bombardeio seria impossível, pois, sem meios, a polícia da Paraíba não conseguiria tal façanha. O Estado havia adquirido dois pequenos aviões, sendo que o primeiro deles havia-se danificado logo na chegada em Piancó e, o outro, sozinho,não teria condições de despejar bombas sobre Princesa, até porque, a pequena aeronave não suportaria o peso dos artefatos fabricados com dinamite. A intenção do Boletim jogado sobre a cidade foi a de intimidar o Coronel e amedrontar a população. Após o desastre de Água Branca e o sítio em Tavares, a polícia de João Pessoa estavacompletamente desesperada com o impasse de não conseguir ocupar a cidade rebelde, tampouco retroceder às suas posições originais. Como bem disse o escritor João Lelis de Luna Freire: “Escasseavam munições de armas e de bocas”. Além do mais, diante das crescentes deserções no seio da tropa, o moral da soldadesca estava no fundo do poço. Sobre a impossibilidade do bombardeio, Joaquim Inojosa escreveu:
“Princesa jamais seria bombardeada, não só pela impossibilidade disso acontecer, como estava convicto o Coronel José Pereira, mas, também, por ser uma mentira de a cidade vir a sofrer o bombardeio pelos aeroplanos da polícia, quando estes não existiam. O que, na verdade, voaria sobre Princesa era um teco-teco adquirido no Recife, de marca Flit, que seguiu encaixotado até Piancó, onde se achavam os aviadores italianos, Fossati e Peroni, e que, ao alçar voo, partiu a asa.Outro foi adquirido imediatamente, por intermédio do aviador Charles Astor, o avião Garoto, propriedade de Reynaldo Gonçalves, que foi pilotado por Peroni, para sobrevoar Princesa e lá soltar aqueles famosos boletins”.
Já o Ministro José Américo de Almeida, no seu livro O Ano do Nego, página 107, no capítulo O Espantalho, escreve:
“Não tive a intenção de bombardear Princesa, nem seria possível fazer isso com um teco-teco. Confiava, porém no efeito psicológico dessa encenação que abateria o moral do inimigo”.
A política do presidente João Pessoa, por conta da grave situação em que se encontrava, vendo os cofres do Estado ficarem vazios cada vez mais, o estado psicológico doscomandantes militares e o moral da tropa em frangalhos e, sem vislumbrar nenhuma solução para o impasse da luta que se apresentava inglória, passou a divulgar notícias falsas, inclusive para o seu tio, Epitácio Pessoa, que se encontrava na Corte de Haia, na Holanda, repassando para o ex-presidente que tudo estava se desenvolvendo a contento. Vejamos telegrama enviado por Epitácio Pessoa ao seu sobrinho, Antônio Pessoa:
“Antônio – Há doze dias tive um telegrama de João: ‘Tudo bem. Avião voou Princesa. Houve debandada. Grupos entregues incêndio, saque, perseguidos polícia. Esquadrilha aviões também seguirá. Este telegrama muito me alegrou, pois dos seus termos deduzo: 1º. Que a gente de José Pereira debandou abandonando Princesa e espalhando-se em grupos pelo Estado. 2º. Que João tem mais de um avião, sem dúvida os dois de que se falava, e assim é falsa a notícia de que um se esboroara. Entretanto os jornais daqui nada publicaram. Será mesmo verdade que tudo está acabado? Do Rio as últimas folhas aqui recebidas são de dois deste mês, seis dias antes do telegrama de João. A propósito só tenho aqui o Jornal do Comércio; do O Jornal não recebi ainda um só número’”.
Como vemos, as informações veiculadas sobre a guerra eram, no mais das vezes, propagandas enganosas, a exemplo dessa ridícula ameaça de bombardeio da cidade de Princesa. A guerra duraria ainda mais vinte dias,quando teria seu final marcado pelo trágico assassinato do presidente João Pessoa.
DSMR, EM 06 DE JULHO DE 2020.
Nenhum comentário:
Postar um comentário