“A GUERRA DE PRINCESA”
TIÃO LUCENA
O livro do princesense, Sebastião Florentino de Lucena, mais
conhecido como Tião Lucena, A GUERRA DE PRINCESA, contido de 194 páginas,
lançado em 2013 pela Editora Bagaço, conta, de forma romanceada e com enfeite
ficcionista (o que, como ele mesmo diz, não altera o valor histórico da obra),
é leitura agradável, irreverente e condutora para o conhecimento de vários
detalhes sobre o conflito que envolveu Princesa e a polícia paraibana entre os
meses de fevereiro e julho de 1930. É a história contada por quem conhece,
realçando um dos episódios mais importantes da historiografia brasileira. O
escritor e jornalista pernambucano, Maurício Melo Júnior, que prefaciou o
trabalho em tela, destacando a importância daquela guerra, insere Princesa no
contexto dos acontecimentos que culminaram com o movimento revolucionário de
1930, quando escreve:
“Aqui se restaura uma história que
está muito além dos estreitos limites da história regional. A guerra de
Princesa foi um dos pontos fundamentais na deflagração da Revolução de 30, que
resultou numa ditadura sangrenta, que estabeleceu as políticas trabalhistas
nacionais, que inaugurou o populismo, que fermentou o Estado Nacional, que,
enfim, abriu as portas de um novo país. E até hoje sentimos roçar na pele
muitos dos ecos daqueles tempos de tantas revoltas”.
Nas páginas 27, 28 e 29, Tião Lucena aborda sobre a primeira
audiência do coronel de Princesa, o deputado estadual José Pereira Lima, com o
novo presidente da Paraíba, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque. Famosa essa
audiência, o autor inicia o capítulo com a resposta de Zé Pereira à inquirição
maldosa e provocadora do presidente, quando perguntou se em Princesa havia
cangaceiros: “Os cangaceiros de Princesa
são os eleitores do seu tio Epitácio”, respondeu Zé Pereira. Irreverente,
Lucena, justifica a antipatia de Pessoa quanto ao Coronel, relatando a “surra”
que um tio deste, deu no pai daquele: “Aquela
surra dada pelo tio de Zé no pai do presidente, em Monteiro, no comecinho do
século, não estava esquecida, pelo visto”. Na página 33, conta sobre a
incontinência intestinal de João Pessoa, quando hospedado na casa do Coronel
José Pereira, por ocasião da visita que fez a Princesa em meados de fevereiro
de 1930 e temeu por sua integridade física.
Porém, o mais importante, por inusitado até agora, são as
referências que Lucena faz sobre as amantes do presidente João Pessoa e sobre o
comportamento de Nominando Muniz Diniz (Seu Mano), antes, durante e depois da
guerra.
Quanto às amantes, quando apenas uma (Cristina Maristany) tem
frequente referência pelos escritores que já trataram do assunto, Tião traz à
baila mais três a que se refere na página 129, inclusive relatando ipsis litteris a briga do médico João de
Brito Athayde Moura com o jornalista Wellington Aguiar. O primeiro afirmando a
existência de uma amante do presidente e, o segundo, eterno defensor de João Pessoa,
negando terminantemente, a existência das mesmas. É claro que é isso coisa
irrelevante para a história, mas que traz à luz algo que desmascara a propalada
“santidade” do presidente paraibano.
Quanto a Nominando Diniz, o autor lhe dedica referências, em
três capítulos, nada abonadoras. Nas páginas 61 e 62, no capítulo intitulado:
“Nominando, o traidor”, fala do bom relacionamento de aliado que Nominando
sempre teve com o Coronel e da repulsa que aquele tinha com relação a João
Pessoa. É tanto que, segundo Lucena, quando o presidente paraibano esteve em
Princesa, Nominando se negou a lhe vender gasolina para abastecer os carros da
comitiva oficial, em retorno à capital do Estado quando da visita a Princesa: “Não vendo gasolina àquele déspota”.
Mais adiante, em outro capítulo que começa na página 87, Lucena faz referência
à atuação do cunhado de Nominando, Joaquim Sérgio Diniz, funcionário da Mesa de
Rendas Estadual e que exercia seu ofício em Misericórdia (atual Itaporanga),
onde desempenhava também o papel de espião, quando enviava informações
privilegiadassobre as estratégias e movimentações do Comando Geral da Polícia
paraibana, em Piancó, através de cartas, para o Coronel José Pereira:
“Cunhado do comerciante Nominando
Muniz Diniz, Joaquim Sérgio morava em Itaporanga, de onde passava as
informações para José Pereira sobre os passos da polícia, através de bem
escritas cartas, que Zé Pereira guardava no seu cofre de estimação, ao lado de
joias da família e de uma coleção de libras esterlinas que mantinha para gastar
em alguma eventualidade”.
Na página 169, Tião relata, com detalhes, o arrombamento do
cofre do coronel José Pereira, sob o comando de Nominando Diniz e com o auxílio
da polícia paraibana. Nesse cofre, estariam as cartas de Joaquim Sérgio que,
altamente comprometedoras, poderiam minar a confiança e o poder de Nominando,
novo comandante da Revolução em Princesa:
“Nominando só não estava inteiramente
feliz por causa das amaldiçoadas cartas do seu cunhado Joaquim Sérgio. Aquelas
cartas da espionagem que ele sabia estarem guardadas no cofre do coronel.
Cartas que ele iria encontrar de qualquer jeito e destruir, pois não era besta
de fornecer provas contra o seu império em formação”.
Pela primeira vez, um escrito sobre os acontecidos de 1930,
em Princesa - o que envolve diretamente as duas famílias mais tradicionais da
política local -, foi dito claramente. E Tião Lucena, sem papas na língua, deu
nomes aos bois e desembuchou tudo: traições, arrombamento,
perseguições...Mostrou também que, tanto Zé Pereira quanto João Pessoa, foram,
ambos, instrumentos a serviço de interesses outros. O primeiro, nas mãos dos
Pessoa de Queiroz que queriam a intervenção na Paraíba e, o segundo, nas dos
revolucionários que careciam de um motivo para deflagrar o levante. Importante,
portanto, a leitura do livro de Tião Lucena. Conciso, de agradável leitura, às
vezes divertido. Se não traz novidades, pelo menos deita no papel verdades escondidas
ao longo do tempo e esclarece muitas das coisas que
aconteceram durante a Guerra de Princesa. Indispensável para quem quer conhecer
a nossa história.
Sebastião Florentino de Lucena nasceu em Princesa, em 19 de
dezembro de 1951, é filho de Miguel Vicente de Lucena e de dona Emília
Florentino de Lucena. Casou-se com dona Cacilda Marques, com quem teve os
filhos: Niani, Felipe e Sebastião Júnior. É advogado, juiz classista,
procurador do Estado, jornalista, blogueiro, escritor e reside, atualmente, em
João Pessoa/PB.
DSMR, em 10 de março de 2021.
Análise honesta, concisa e que muito me emocionou. Peço permissão pra republicar.
ResponderExcluirCaro Dominguinhos
ResponderExcluirAssino embaixo o que você escreveu a respeito do livro de Tião. Excelente análise. O seu blog tem dado valiosas contribuições para a cultura do nosso estado e sobretudo para Princesa.
O livro de Tião é bom em todos os aspectos, inclusive graficamente. Foi minha a ideia de publicá-lo pela Bagaço, de Recife. O editor chama-se Arnaldo Afonso, e é o maior e melhor editor do estado de Pernambuco. Tenho dois romances editados pela bagaço. Tenho inclusive um contrato assinado, com firma reconhecida, de publicação de uma segunda edição do romance A dançarina e o Coronel.
Voltando a Sebastião Florentino de Lucena, Arnaldo Afonso endoideceu quando viu os arquivos do livro dele que eu mandei. A resposta para publicação foi na hora. Um sucesso editorial.