Eu não tenho mãos finas nem sedosas
Uso roupas da grife ‘mei’ de feira
Meu perfume é da flor da catingueira
Meus passeios são nas serras pedregosas
Meu transporte não tem marcas luxuosas
A linguagem que eu uso é de matuto
Nesse meio fui posto, sou produto
Vou trilhando bem firme minha estrada,
Vitamina pra mim é imbuzada,
E a fruta de palma é o meu fruto.
Minha hora de acordar é manhazinha
Tem um galo que é meu despertador
Com auxílio dum golinha cantador
Que habita por aqui num pé de pinha.
Meu café tem cuscuz com uma graxinha
Tem inhame, batata e carne assada
Não me falta um prato de coalhada
E um rádio ABC pra dar notícia,
Outra vida pra mim é fictícia
A que eu levo não troco ela por nada.
Tem as flores com sua exuberância
Enfeitando o terreiro da morada
A vivenda esperando minha amada
Pra se encher de fervor e abundância.
Pelos cantos da casa tem fragrância
Exalando perfume de canela
Um desejo que me invade e me esfacela
Coração inundado de amor,
Tem moldura que tá no corredor
Pra um dia eu botar a foto dela.
Rena Bezerra
21/04/22
Parabéns, vizinho.
ResponderExcluirCaro Dominguinhos
ResponderExcluirJá li várias vezes o poema de Rena Bezerra. Derna de anteontem que remoo esse seu hino das coisas simples, essa sua ode à glorificação do campo, essa sintaxe de valorização da vida longe dos centros urbanos e da estúpida sociedade de consumo cujo sentido de vivar está nas gôndolas dos supermercados e nas lojas de departamentos dos shopping centers, uma gente que come hambúrguer e salsicha e caga miojo todo dia. Tudo o que é feito com engenho, verdade e método tende a ficar perfeito e ganhar foros de eternidade. Rena Bezerra salva a matéria rural porque sua sintaxe é elaborada, elegante e contida, sem arroubos de retórica, longe do caipirismo e do pitoresco que compromete a qualidade estética da poesia popular de cordel.