quinta-feira, 2 de março de 2023

O PANTIM DE MANÉ GATO

 

Para quem ainda não foi apresentado a palavra pantim, tenho que informar que ela se presta a vários significados. Desde o indivíduo falso, até aquele que cria situações distantes da realidade poderão ser adjetivados de pantimzeiros. Há pantimzeiros maliciosos e há aqueles que exercem o pantim por pura distração artística. Mané Gato pertencia a esta última categoria. 

Era um indivíduo pacífico, magrinho e exercia a extinta profissão de pintor de paredes, quando ainda as paredes eram pintadas com cal. No dia a dia Mané Gato era um sujeito contido, humilde e gentil com todos. Ocorre que aquele homem contido trazia um leão enjaulado em sua alma, e a fera presa só era libertada de seu cativeiro  com algumas boas e repetidas doses de cachaça. E aí, bem calibrado, Mané Gato deixava o leão urrar pelas ruas de Princesa Isabel. O dono do leão tinha uma voz baixa, rápida e costumava engolir sílabas inteiras. 

Era comum perguntarmos: "Como foi Mané?", "Quando?", "Em que canto?" tamanha era a dificuldade dos nossos diálogos com ele, principalmente quando o nosso herói estava de férias transitórias e comemorando a sua bravura. Era uma figura formidável! Fazia parte da paisagem urbana e humana de Princesa Isabel. Quando devidamente preparado para contar as suas aventuras, era comum alguém que teria sido morto por Mané Gato, na própria estória dele, voltar ao palco da estória e continuar vivendo normalmente. 

Os personagens iam e vinham, como nas estórias das crianças, sempre com um herói previsível: o próprio Mané. Ele era o seu herói preferido, o homem que nunca teve a menor preocupação com a lógica cotidiana do povo, e que jamais pediu licença às conveniências sociais para representar o papel que escolheu ser na vida, desde que o licor de Baco estivesse presente nas histórias e na cabeça do herói. Mané Gato foi um homem simples, que fez parte de minha infância e de minha juventude. Uma alma leve, um cidadão gentil, um ser humilde que, nas vezes que bebia cachaça,  transformava-se em um herói de gibi a encantar a todos com suas estórias inesquecíveis. Ele teve que ir. O seu legado de alegria ficou.                         

Wellington Marques Lima



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