sexta-feira, 7 de abril de 2023

A Santa Sexta

Desde criança convivi com as coisas da Igreja. Filho de mãe catoliquíssima, barata de igreja mesmo, frequentava, diária e obrigatoriamente, todas as solenidades da Igreja: da missa matinal à bênção do santíssimo sacramento, à noite. Acho que, por isso, sempre fui fascinado pela ritualística das solenidades da Igreja Católica. Na Semana Santa, então, fazia morada na chamada "Casa de Deus". Do "Lava-pés", passando pela celebração da Paixão com a vigília, o beijamento da cruz, a procissão do "Senhor Morto" até a Aleluia, de tudo participava ativamente e em perfeita contrição de fé.

A sexta-feira Santa era o ápice das celebrações religiosas da Igreja de Roma. O dia era cheio. Desde a tarde da quinta-feira, passando por toda a madrugada, acontecia a adoração do "Santíssimo Sacramento", o que simbolizava a agonia de Jesus no Horto das Oliveiras. À tarde, a partir das três horas da tarde, acontecia a celebração da Paixão com uma missa concelebrada por vários padres, cantada em latim e cheia de simbolismos, a exemplo da queda dos padres quando se deitavam ao chão comemorando o momento da execução do Cristo.

Até pouco tempo atrás era, a Sexta-feira Santa, era o dia mais santificado da comunidade cristã. Simplificado e pouco difundido, hoje, foi banalizado e perdeu a magia que havia em torno dessa celebração. Não há mais matraca nem procissão das tochas. Tampouco o cortejo fúnebre do Senhor Morto tem mais a importância e o "mistério que tinha, quando os fiéis acompanhavam a procissão no afã de conseguir um galho ou uma flor que ornamentava o esquife divino para transformá-la em chá curativo de todos os males.

Os tempos são outros e, o culto às tradições, se restringe a um público mais conservador e idoso que não conseguiu se desvencilhar dessa liturgia que embevecia a todos. A Semana Santa, hoje - tal qual o Carnaval -, significa apenas um feriado prolongado que permite, à maioria das pessoas, se desobrigarem de seus afazeres para descansarem, se empanturrarem de iguarias nobres sem estarem nem aí para os simbolismos da religião que cultivaram um dia. No meu caso, mesmo sem muita crença, continuo fascinado pela ritualística.



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