domingo, 8 de setembro de 2024

Domingo eu conto

Por Domingos Sávio Maximiano Roberto

A posse de Lampião

Em que pese estar fincada num distante rincão da Paraíba, a cidade de Princesa, desde priscas eras vem sendo revestida de importância histórica. Já por duas vezes a cidade foi detentora do status de capital - tanto geográfica, quanto social – de uma região ou de uma situação. Em 1930, durante os 5 meses em que durou a chamada “Guerra de Princesa”, a cidade foi a capital da região compreendida pelo território que abrangia desde Água Branca até Manaíra, durante o espaço de tempo em que Princesa ficou separada do estado da Paraíba. Nesse período, na condição de sede do Território Livre de Princesa, tivemos hino, jornal, bandeira e até um Ministério formado por notáveis da Terra.

A outra oportunidade em que Princesa se fez capital foi mais emblemática ainda. Algo que poucos sabem, no entanto, se reveste de grande importância histórica. Foi aqui em Princesa, exatamente na “Fazenda Pedra” (hoje pertencente ao município de São José de Princesa), termo que fazia parte, à época, do latifúndio do agropecuarista Laurindo Diniz, o local onde Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, tomou posse para se tornar o maior cangaceiro do Nordeste, quando assumiu a chefia do bando que era, até então, comandado por Sebastião Pereira da Silva, vulgo Sinhô Pereira. Isso, em fins do mês de setembro de 1922, portanto há pouco mais de 100 anos passados. Em face desse evento, Princesa tornou-se, pelo menos por um dia, a capital do Cangaço.

Registrado no livro: “Apagando o Lampião”, do historiador Frederico Pernambucano de Mello, às páginas 96 e 97, está consignado:

Novamente, nos valemos do testemunho de Maura Lima Cabral, presente à comemoração da “tomada de posse” de Virgulino na chefia do grupo herdado de Sinhô, festejo verificado em fins de setembro de 1922, na fazenda da Pedra, presentes o prefeito eleito de Triunfo e o juiz de direito de Princesa (...).  

Nesse dia, grande festa ocorreu naquela fazenda e no arruado de Patos (atual Patos de Irerê), com a participação do amigo e coiteiro de Lampião, Marcolino Florentino Diniz (Caboclo Marcolino) e, como vimos, com a presença de autoridades constituídas. Dentre essas autoridades estavam, o prefeito eleito de Triunfo/PE, Carolino Campos (Coronel Duduzinho) e o juiz de direito da Comarca de Princesa, doutor Geminiano Jurema Filho. Naquela ocasião, Sinhô Pereira, a pedido do padre Cícero Romão Batista, abandonava a vida no Cangaço, passando o comando de seu bando para Lampião, e retirava-se para o interior do estado de Goiás e, depois, para Minas Gerais.

Na ocasião desse evento festivo, todos os ilustres que faziam parte da sociedade das cidades de Princesa e de Triunfo, se fizeram presente ao evento. Um baile foi realizado no armazém da fazenda Pedra e, antes disso, um lauto jantar foi servido às autoridades na casa do caboclo Marcolino. De todas as personagens importantes da região, as únicas que não compareceram foram, o coronel José Pereira Lima e o vigário de Princesa, padre Florentino Floro Diniz. Depois do jantar, foi proferido um discurso pelo cunhado de Zé Pereira, o presidente do Conselho Municipal (equivalente à Câmara de Vereadores) de Princesa, o major Inocêncio Justino da Nóbrega.

Há quem diga que o aconselhamento para que Sinhô Pereira abandonasse o Cangaço, foi feito pelo padre Cícero Romão Batista. O sacerdote do Juazeiro era grato a Sinhô Pereira desde 1914 quando este, com apenas 20 anos de idade, auxiliara o reverendo nas lutas da chamada “Sedição do Juazeiro”. E Lampião, além de parente de Sinhô Pereira, era o cabra mais valente e detentor de inteligência notável dentre os que faziam parte do bando e, por isso, foi escolhido para suceder Sinhô Pereira que, com apenas 26 anos de idade já se retirava do Cangaço.

Como vemos, Princesa foi palco de eventos por demais importantes da história nordestina, com reverberação nacional e até internacional. Afinal, além da “Guerra de Princesa” (que foi o estopim da Revolução de 30 e noticiada até pelo jornal The New York Times), sediou também a “posse” de Lampião como chefe do maior e mais importante bando do Cangaço nordestino. Depois de empossado em Princesa, em breve tempo, Lampião se tornaria o “Rei do Cangaço”, figura festejada e antagonizada em todo o Brasil e até no estrangeiro.

Fala-se até numa baronesa francesa que veio da Europa para conhecer Lampião e foi cumprimentada, em Recife, pelo caboclo Marcolino na presença do famoso escritor Gilberto Freyre. Diante disso, fica patente a inserção de Princesa em momentos históricos de suma importância. Além de haver sido capital duas vezes, Princesa detém um capital político, histórico e social de indelével importância.



 

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