A CULPA DE WASHINGTON
LUÍS
Finda a Guerra de Princesa, começaram as especulações sobre
suas causas e seus efeitos. Inicialmente, o que mais realçou – com o claro
intuito de fomentar motivos que levassem à eclosão do movimento revolucionário
que estava sendo urdido nos porões dos quartéis -, foi a participação do
Governo Federal, através da iniciativa - ou ausência dela - do presidente
Washington Luís. Intensificaram-se as acusações contra o presidente da
República, o que, com a morte de João Pessoa, ganhou corpo a versão de que fora
o presidente o grande apoiador da Revolta de Princesa. Tudo fazia crer ser isso
uma verdade inconteste. A começar pela proibição da importação de armas e
munições pelo Governo paraibano até à constatação de que os homens de Zé
Pereira lutavam com armas e munições privativos do Exército Brasileiro. Em
março de 1934, amainados os ânimos e restauradas as liberdades democráticas, o
assunto veio novamente à tona, através da imprensa brasileira, e o
ex-presidente Washington Luís, exiliado em Paris, diante das várias acusações
veiculadas pelos jornais, rompeu o silêncio, e afirmou, através das páginas do
jornal Correio da Manhã, em 14 de
março de 1934, sobre a Rebelião de Princesa, categoricamente:
“Não a criei, não a mantive, não a
auxiliei. (...) Tive conhecimento do que se passava no sertão da Paraíba por
telegrama do Presidente João Pessoa que considerava o caso exclusivamente
policial. (...) O qualificativo policial
dado ao caso queria evidentemente informar que ele era da competência do poder
estadual, acrescentando o Presidente do estado que tinha os recursos próprios
para normalizá-lo prontamente (...). A situação tomava, entretanto, no sertão
da Paraíba, maiores proporções que as previstas a princípio e ameaçava
agravar-se.”.
Em sua defesa, Washington Luís argumentou também que
recomendou a tão desejada intervenção federal no Estado da Paraíba, porém, com
a ressalva de que essa iniciativa deveria partir ou do Estado em questão ou do
Poder Legislativo Federal. Acrescentava,
o presidente da República, que a Guerra de Princesa não foi provocada nem
amparada pelo seu Governo, sob a alegação de interferir ou coibir as eleições
daquele ano, uma vez entender que o eleitorado da Paraíba não influiria no
resultado do pleito de 1º de março.
Em contrapartida às argumentações de Washington Luís, um
artigo, escrito pelo paraibano e ex-presidente da República, Epitácio Pessoa,
veiculado pelo Jornal do Rio, em 25
de março de 1934, atestava veementemente, a participação do então chefe da
Nação naquele conflito:
A culpabilidade do sr. Washington
Luís no levante de Princesa ficou claramente definida por abundante
documentação. O ex-Presidente tinha conhecimento de que, antes das eleições, o
sr. José Pereira se levantaria em armas contra o governo estadual, auxiliado e
estimulado pelos elementos arregimentados à candidatura Prestes, que agiam em
Recife, Paraíba, nesta capital [Rio de janeiro] e em São Paulo. Havia constante
permuta na correspondência, da qual se encontraram em Palácio cópias e
originais dos pedidos de munição e recursos, bem como os avisos de remessa,
sendo que da munição se comunicava até o vapor em que seguia e a forma de
acondicionamento... Em uma das cartas em que se fazia referência à remessa de
munições para Princesa, existia a comunicação de que a Paraíba estava esperando
recursos bélicos do Sul e se pedia ao sr. Washington Luís que impedisse a
entrada desses elementos de defesa.. O ex-Presidente mandou comunicar aos amigos
do chefe dos cangaceiros que “para o Governo estadual da Paraíba não entraria
nem uma bala...”. E não auxiliou José Pereira! Desengane-se o sr. Washington
Luís, a História jamais o absolverá da sua quota de responsabilidade no “caso
de Princesa”, crime nefando que atentou contra a cordura natural dos nossos
sentimentos e os nossos foros de nação culta, que inundou o meu Estado com o
sangue de centenas de seus filhos e culminou no miserável assassínio de João Pessoa,
tudo isto porque este tivera a veleidade de pensar que vivia num país onde era
livre ao cidadão não sufragar os candidatos do chefe do Governo.
A polêmica não cessou, tampouco os argumentos do
ex-presidente Washington Luís se apresentaram convincentes. Porém, o balde de
água fria sobre a inconsistente defesa do ex-presidente, veio quando do
depoimento do então Procurador Geral da República no Estado da Paraíba, o
senhor Adhemar Vidal, que afirmou o seguinte:
A esposa de José Pereira, d.
Alexandrina Pereira Lima, solicitou inquérito à polícia, depois da Revolução,
isto é, em outubro de 1930, declarando que seu marido: “(...) recebeu dos próprios representantes da República, srs.
Washington Luís e Júlio Prestes, dinheiro, munições e armamentos”. Este
trecho consta também de um parecer dado, como consultor jurídico, pelo deputado
Irineu Joffily. Se não fossem conhecidos outros documentos a respeito da
contribuição federal, bastaria o depoimento acima para ficar demonstrado o
amparo agora negado. Este ponto está fora de dúvida. Passemos ao esclarecimento
de outros.
Fica patente e definitiva a certeza de que o presidente
Washington Luís, se não concorreu ou contribuiu direta e oficialmente para a
manutenção da resistência de Princesa aos ataques da polícia de João Pessoa,
permitiu, anuiu ou fez vistas grossas aos concursos de várias autoridades
federais e importantes correligionários (inclusive o presidente eleito, Júlio
Prestes), para a manutenção da Revolta de Princesa, da mesma forma em que
dificultou as ações do presidente paraibano e suas gestões junto aos poucos
simpatizantes com a causa (Minas Gerais e Rio Grande do Sul), para auxiliá-lo.
O depoimento da esposa do coronel José Pereira, dona Xandu, aliado às
evidências, dava validade definitiva às denúncias de complô dos perrepistas em
prol da Guerra de Princesa, que evoluiu em constante desiderato para
defenestrar o presidente João Pessoa, mas que, ironicamente contribuiu para o
concurso do movimento revolucionário que acabou com a República Velha e
derrubou Washington Luís.
DSMR, EM 24 DE SETEMBRO DE 2020.
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