sexta-feira, 2 de abril de 2021

LER PARA CONHECER A NOSSA HISTÓRIA

 




1930 – A Paraíba e o inconsciente político da revolução

DINARTE VARELA BEZERRA

Lançado pela Editora CCTA - Centro de Comunicação, Turismo e Artes da UFPB em 2016, o livro: 1930: A Paraíba e o inconsciente político da revolução, de autoria do professor Dinarte Varela Bezerra, contido de 237 páginas, resultado da tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Rio Grande do Norte - apresentada em julho de 2008 -, é um formidável trabalho acadêmico que analisa e resgata verdades sobre a Revolução de 1930 na Paraíba. Segundo o autor, a produção literária, na Paraíba, sobre a Revolução de outubro de 1930, “(...) instaura a sintonia de uma contradição que, ao passar dos anos foi se reproduzindo e rompe o silêncio sobre uma realidade que permanecia reprimida e oculta, a gerar um sistema de valores em oposição à verdade da Revolução de 30 como domínio da memória histórica a serviço dos vencedores”.

Nesse estudo acadêmico, Princesa está presente em várias partes do trabalho de Varela. Na página 30, o autor afirma, sobre a Guerra de Princesa:

“A Revolta de Princesa visava a intervenção federal no governo da Paraíba, atitude que pode ser compreendida como manobra política do coronel José Pereira e seus aliados, os Pessoa de Queiroz, parentes de João Pessoa. Estes construíram um vasto império mercantil, como representantes de várias multinacionais, que abrangia a importação de farinha de trigo, os negócios do ramo da indústria automobilística ao ramo do petróleo, com o próprio José Pereira representante da Esso na cidade de Princesa. (...) Foi no contexto do conflito armado entre a milícia particular do coronel José Pereira e a Polícia Militar paraibana que ocorreu o assassinato de João Pessoa, a 26 de julho de 1930, por João Dantas, aliado de José Pereira, na cidade do Recife”.

De forma imparcial – por tratar-se de um estudo analítico sobre os eventos da Revolução de 30 na Paraíba -, podemos observar no excerto acima, que o autor não denomina os “cabras” de Zé Pereira de cangaceiros, mas de “milícia particular”. Adiante, Varela fala dos “erros” e “lapsos” contidos nas biografias de João Pessoa e de João Dantas, ambas de autoria de Fernando Melo, quando realça a martirização de João Pessoa e os elogios demasiados ao homem que matou João Pessoa.

Mesmo tratando-se de um estudo acadêmico, o livro de Varela contém equívocos, a exemplo do contido na página 43, quando o autor se refere à música de Luiz Gonzaga, Paraíba, de autoria de Humberto Teixeira, como sendo dedicada à mulher do coronel José Pereira: “Xanduzinha”. É sabido que essa Xanduzinha não era a esposa (homônima) do coronel, mas sim a mulher de Marcolino Florentino Diniz, sobrinho e cunhado do coronel Zé Pereira.

Realçando as causas e os efeitos das ações do reformista governo de João Pessoa, na página 51, o autor cita Joaquim Inojosa sobre o propósito da Reforma Tributária promovida por João Pessoa, com o intuito de prejudicar José Pereira e os Pessoa de Queiroz, o que resultou “no ato unilateral de independência do município de Princesa em Território Livre, seguida da Guerra Civil paraibana”. Enfatizando a efetiva participação de Princesa no desenrolar dos fatos que culminaram com o assassinato da Confeitaria Glória e a consequente eclosão da Revolução de 1930, na página 63, o autor escreve:

“Segundo Mello [o escritor Fernando Mello], a invasão [do escritório de João Dantas], apedido de Ademar Vidal, realizada pelo delegado Manuel Morais, não foi um ato fortuito, mas resultado do acirramento da guerra civil de Princesa e da obsessão de João Dantas em criar uma segunda frente de luta partindo de Natal para ocupar a capital paraibana que estava desguarnecida, liquidando o governo paraibano, na tentativa de causar a intervenção federal desejada pelos revoltosos”.

No livro, Varela recorre a obras de escritores consagrados como a de Ariano Suassuna: História d’o rei degolado nas Caatingas do Sertão: romance armorial e novela romançal brasileira – Ao sol da Onça Caetana, onde “o escritor confirma a suspeita de que sua narrativa [Ariano Suassuna] busca mais do que o entretenimento. Ela se ergue como um monumento à verdade. Da memória irrompe o testemunho do privado para nos dar a dimensão do sofrimento real”. Excerto da obra mencionada:

“(...) Aqueles que ouvem o nome ‘Princesa’ e evocam, mesmo sem querer, tanto uma Mulher coroada, como – e mais ainda! – a épica Cidade sertaneja, encravada no alto de uma Serra áspera e pedregosa, Reino onde José Pereira, aliado a minha família, resistiu, vitorioso, a um cerco de oito meses, naquele mesmo ano de 30”.

Na página 117, Varela faz um resgate histórico, ancorado no excelente escrito do intelectual princesense, Aldo Lopes: O Dia dos Cachorros:

“A bandeira do Território Livre de Princesa é descrita pelo narrador d’O dia dos cachorros, autoria de Aldo Lopes, como ‘um retângulo amarelo com fundo azul e uma estrela de cauda em forma de arco-iris. Acima, nos cantos superiores do retângulo, havia uma flor de algodão e outra de mandacaru. (...) E, diferente da simbolização da rubro-negra, luto e sangue, a ‘bandeira de Princesa era outra coisa, bandeira luminosa, sensual, pulsava vida, luz e alegria”.

Contextualizando Princesa nos fatos que desaguaram na eclosão da Revolução de 1930, na página 122, o autor encerra:

“A atitude do governante paraibano em aderir à chapa da Aliança Liberal terá como consequência a declaração do município de Princesa em território livre da administração estadual e, em seu bojo, a guerra civil paraibana, pejorativamente denominada de a ‘Revolta de Princesa’, comandada pelo Coronel José Pereira Lima, concluída com o assassinato de João Pessoa”.

Este livro, de excelente leitura, talvez o que trata dos acontecimentos de 1930, na Paraíba, com maior isenção, é indispensável para quem quer conhecer a nossa história. Em que pese ser um trabalho acadêmico, o autor prima por uma escrita por demais compreensível.

Dinarte Varela Bezerra é professor Associado da Universidade Federal da Paraíba, no Departamento de Jornalismo do Centro de Comunicação, Turismo e Artes. Graduado em Comunicação Social-Jornalismo (1987), pela UFPB, Mestre em Letras pela UFPB (2002) e Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2008).

DSMR, em 02 de abril de 2021

Um comentário:

  1. Caro amigo Dominguinhos
    Excelente matéria dobre esse livro de Dinarte. Conheço Dinarte dos tempos da UFPB, do glorioso DAC, das lides culturais e estudantis. Sempre foi um cara muito talentoso e hoje professor conceituado nos meios acadêmicos. Embora meu livro seja um romance, obra de ficção, fico feliz em ter sido citado em seu estudo. Vou procurar o livro. Estou curioso. Este blog tem trazido a lume artigos importantes sobre a nossa história. E você, na condição de articulista e resenheiro (politiqueiro também, e por que não?) anda de rédeas soltas.

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