Nós, os princesenses que estamos na casa dos 60, 70 anos,
apesar de estarmos na (falsamente) chamada de “Melhor Idade”, temos o alento de
havermos sido testemunhas de quase todas as fases da vida de Princesa. Quando
nascemos e vivenciamos nosso período de crianças, Princesa estava ainda em
situação de extremo atraso em relação ao resto do mundo. Somos do tempo em que
não havia luz elétrica e éramos iluminados por candeeiros e lampiões
alimentados pelo querosene comprado na bodega de João Rosas, acondicionado numa
garrafa amarrada com um barbante pelo gargalo; do tempo em que não existia água
encanada e a cidade era abastecida por um jegue encangalhado transportando
quatro latas com água e tangido por Zé Vermelho; do tempo em que não
conhecíamos o “Bombril” e as panelas eram areadas com a areia que Benedita
“Pratudo” trazia dentro de uma mochila de chita. Fogão a gás? Ninguém sabia o
que era. Nem os ricos. Estes cozinhavam com carvão e, os pobres, na lenha.
Testemunhamos o advento da garrafa automática e da geladeira. Televisão, só a
de Waldemar Abrantes – em preto e branco e chiando. O pão, comprado nas
padarias de Tião Basílio e de Rafael Rosas ou na de Pedro Sobreira, não era
“francês” nem de forma, mas, “aguado”, “crioulo” ou “doce”, que vinha
acondicionado numa mochila de pano com a inscrição: “pães”. Bolacha
“cream-cracker” ou “maria”, só para quem estava muito doente e macarrão somente
na mesa dos ricos. O galeto de hoje era chamado de galinha assada e só se comia
nas festas de fim de ano. Refrigerante era gasosa e quem bebia eram os
endinheirados. Os pobres se contentavam com o Capilé de João Costa e com o
Cachorro Quente de Maria Costa. Enquanto os filhos dos ricos passeavam de Roda
Gigante, os da “rafameia” se deliciavam com os balanços nas canoas de Manezim
Cristóvão. Era assim a Princesa que conhecemos quando crianças.
Vida social e religiosa
Diferente de hoje, as escolas funcionavam como uma extensão
da nossa casa. A professora era uma segunda mãe, a quem respeitávamos. O ensino
tinha qualidade porque os mestres, além de competentes, tinham vocação para o
magistério. Além de estudarem, as crianças cumpriam à risca as etapas da vida:
brincavam inocentemente. Os meninos obedeciam às épocas das brincadeiras. No
inverno, rodar pião e jogar triângulo; no Carnaval, sair de careta; na semana
Santa, matar o “Judas”; no São João, dançar Quadrilha, dentre outros
divertimentos. As meninas brincavam de roda, do “Passarás” e jogavam “Cinco
Pedras”. Aos domingos, como mandava a Santa Madre Igreja, logo cedo, os filhos
e filhas das famílias chamadas “de bem”, iam todos para a missa envergando sua
fita da Cruzada Eucarística. Terminada a missa voltavam para casa e, depois do
café, retornavam à Igreja para estudar o catecismo em preparação para a
Primeira Comunhão. À tarde, quase todos iam assistir à Matinê no Cine “Santa
Maria”. Para os jovens, era reservada uma vida de quase inocência. Havia
namoros, beijos na boca e muito sarro. Tudo isso, no mais das vezes, acontecia
por ocasião dos “Assustados” (danças ao som da radiola em casas de
residências). Transar era “crime inafiançável”. As etapas do amor eram também
obedecidas à risca: flerte (paquera); namoro; noivado e casamento. Hoje em dia,
o relacionamento de rapazes e moças é chamado, simplesmente, de “Fica”. Tudo é
permitido e nada é proibido. Até Roberto Carlos parou de gravar discos porque a
juventude não se apaixona mais. O romantismo de outrora deu lugar ao hedonismo
de hoje. A moda agora é Wesley Safadão; Márcia Filipe, dentre outras “pérolas”
da música nacional. Saudosismo é como gaiola bonita: não dá de comer a canário.
Porém, vale a pena recordar os tempos de antanho quando - em que pese o atraso
-, observamos o saldo positivo de uma formação decente baseada em princípios
éticos e morais que hoje são considerados retrógrados e fora de moda.
Infelizmente, a fila anda e, muitas vezes, para trás.
ESCRITO POR DOMINGOS
SÁVIO MAXIMIANO ROBERTO, EM 21 DE JANEIRO DE 2020.
Realmente, foi uma era de ouro. Momentos inesquecíveis. Para acrescentar, quero lembrar das serenatas que fazíamos utilizando a vitrola do "Bebê de japonês" hoje De. Gilson Kumamoto. Muito bom!!!
ResponderExcluirEita....lendo e e visualizando todos os cenários passados de uma vida real!!😍🤔Lindo texto... parabéns!!
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