Em 22 de fevereiro de 1930, portanto há exatos 90 anos atrás,
o deputado José Pereira Lima, mais conhecido como coronel Zé Pereira, rompeu
politicamente com o presidente da Paraíba, João Pessoa Cavalcanti de
Albuquerque. Há apenas dois dias, havia estado em Princesa, o presidente
paraibano, em visita de cortesia ao coronel o que denotava estar tudo bem. Mas
não, as dissenções e os conflitos de interesses já existiam. O primeiro fato
que pôs o coronel e o futuro presidente do Estado em campos antagônicos,
remonta ao início da década de 1920 quando o médico Bandeira Filho, casado com
uma prima de João Pessoa Cavalcanti, foi assassinado no Recife por outro primo
do futuro presidente, Epitácio Pessoa Sobrinho (Epitacinho) sob suspeita de que
a esposa deste o estava traindo com o médico assassinado. Após esse trágico
episódio, a família “Pessoa” separou-se em dois ramos antagônicos: o de
Umbuzeiro/PB e o de Recife. O chamado ramo de Umbuzeiro aglomerava os “Pessoa
Cavalcanti” e, o da capital pernambucana, os “Pessoa de Queiroz”. Desse
episódio nasceu a primeira queixa do futuro presidente com relação ao coronel
Zé Pereira pelo motivo de que este, na qualidade de amigo e compadre de João Pessoa
de Queiroz, haver dado guarida ao assassino do médico que era irmão de seu
compadre. Epitacinho veio para Princesa, onde residiu até seu julgamento pela
Justiça e, durante esse período, residiu na cidade, num palacete que mandou
construir e, após sua liberdade voltou ao Recife e presenteou o imóvel a
Luizinha que era filha do coronel José Pereira. Os “Pessoa Cavalcanti” jamais
perdoaram o coronel pelo homízio concedido ao primo assassino.
Mais motivos
Outro fato que serviu como caldo de cultura para o rompimento
foi quando João Pessoa foi eleito presidente da Paraíba e já na sua posse,
perguntou, em palácio, ao coronel Zé Pereira se este mantinha cangaceiros homiziados
em Princesa, ao que Pereira respondeu rispidamente: “Os cangaceiros que existem em Princesa são os eleitores de seu tio
Epitácio”. Já não se bicavam. O coronel tinha também conhecimento de um
comentário proferido por João Pessoa quando, já eleito presidente do Estado,
ainda no Rio de Janeiro, dissera: “Na
Paraíba está tudo podre. Assumindo, resolverei tudo de uma vassourada! Os
primeiros que enquadrarei serão os Dantas de Teixeira, os Santa Cruz de
Monteiro e Zé Pereira de Princesa!”. Como se não bastasse, o presidente, já
empossado, determinou o fim da comercialização do que era produzido no sertão
do Estado com as empresas do estado de Pernambuco, numa afronta direta aos seus
primos e amigos de Zé Pereira, os “Pessoa de Queiroz”. Além disso, majorou
todos os impostos, instituiu cancelas nas divisas da Paraiba com Pernambuco e
determinou que toda a comercialização deveria ser feita através do porto de Cabedelo.
Ainda insatisfeito com a perseguição a seus desafetos, o novo presidente
demitiu vários funcionários públicos, inclusive um dos irmãos de Zé Pereira,
que era chefe da ”Mesa de Rendas” (Coletoria) do Estado na cidade de Princesa.
Diante desse quadro, o que já se constituía um pote cheio de mágoas veio a
formação da chapa que disputaria as vagas para a Câmara Federal e para o
Senado. A prática até então era a recondução dos deputados à reeleição. João Pessoa,
num acinte a seus próprios correligionários resolveu “renovar” a chapa que
disputaria aquelas eleições que ocorreriam no dia 1º de março, pleito em que
ele próprio concorria à vaga de vice-presidente da República na chapa
encabeçada por Getúlio Vargas. Porém o que mais indignou o coronel foi a
retirada do nome de seu amigo e ex-presidente do Estado, João Suassuna, da
chapa que concorria à Câmara Federal.
A “Gota D’água”
Sob o pretexto de promover a renovação da chapa, o presidente
João Pessoa retirou todos os nomes que já detinham mandatos, mantendo, portanto,
o nome de seu primo Carlos Pessoa. Isso afetou sobremaneira os ânimos
partidários. Muitos tentaram ainda demover o presidente dessa insensatez. Em
vão, Pessoa manteve sua intenção e, à revelia da Comissão do Partido
Republicano da Paraíba, em 17 de fevereiro daquele ano, assinou o chapa sozinho
e da forma que quis. A essa altura, a intenção e os motivos para o rompimento
já haviam amadurecido. É sabido que, na véspera da visita do presidente a
Princesa, o coronel José Pereira havia se reunido, na vizinha cidade de
Triunfo/PE, com o industrial João Pessoa de Queiroz e alguns correligionários e
ali resolveram que, se o presidente não desistisse da imposição da chapa sem o
nome de Suassuna, romperiam politicamente com ele, bandeando-se para emprestar
apoio à chapa oficial do partido Republicano Paulista que defendia a
composição, para a presidência e vice-presidência da República, os nomes de
Getúlio Vargas e Vital Soares, respectivamente. Em face de tudo isso, o
rompimento se fez realidade e, no dia 22 de fevereiro de 1930, o coronel, através
do telegrafista Richomer Barros, expediu telegrama ao presidente da Paraíba
informando seu desligamento do Partido. Desacreditado, João Pessoa solicitou
confirmação, ao que Zé Pereira reafirmou o rompimento, acrescentando que
estaria pronto e disposto a defender a cidade e seus amigos das retaliações que
acreditava seriam promovidas por João Pessoa. Começou aí a Guerra de Princesa.
(ESCRITO POR DOMINGOS
SÁVIO MAXIMIANO ROBERTO, EM 22 DE FEVEREIRO DE 2020).
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