A REVOLUÇÃO ESTATIZADA
Um estudo sobre a formação do
Centralismo em 30
JOSÉ OCTÁVIO
DE ARRUDA MELLO
Resenhar essa obra de
José Octávio de Arruda Mello, se constitui atrevimento sem par. Ameniza-se a
afoiteza quando informamos que nos ateremos apenas aos capítulos que tratam da
participação de Princesa naquele importante evento histórico: A Revolução de 1930.
Nesse livro, A REVOLUÇÃO ESTATIZADA, 616 páginas, eduepb – Campina Grande –
2014, publicado em 3ª edição, José Octávio trata daquele Movimento
Revolucionário, realçando a correlação envolvendo os acontecidos na Paraíba e
no Brasil. No prefácio do trabalho, o escritor e cientista político, Hélio
Jaguaribe, diz:
“O muito que tinha a dizer (sobre a
Revolução de 30), foi, finalmente, compendiado neste livro. (...) O governo de
João Pessoa, na Paraíba, exprime, por antecipação ao movimento de 30, essa superação
do coronelismo clássico, cuja inconformidade com as novas condições conduz à
revolta de Princesa”.
Vê-se aí, a
importância de Princesa no contexto do Movimento Revolucionário que extinguiu a
Velha República. Foi, segundo Jaguaribe, um autoritarismo de classe média
exercido contra os notáveis do velho regime, incluindo aí, os coronéis do
Nordeste, com destaque para o principal deles, o coronel Jose Pereira Lima.
Anota, JosOctávio, que o presidente João Pessoa elegeu como seu alvo principal
(porque preferencial), o município de Princesa.Em resenhas anteriores, já
anotamos o comentário do futuro governador da Paraíba [João Pessoa], quando
ungido candidato por Epitácio Pessoa assertivando que só uma vassourada em
regra, poria as coisas no eixo, na Paraíba. A título de ilustração, excertamos
parte do contido na página 373:
“Caracterizado o impasse, Pessoa não
perdeu tempo em utilizar o poder público contra essas estruturas, fosse
exonerando os prefeitos e vice de Princesa, sintomaticamente deixados sem substituto,
fosse revogando a chefia local do Coronel José Pereira, ou ainda, em meados de
março, atingindo todo professorado de Teixeira, Água Branca e Princesa, além de
Catolé do Rocha”.
Daí depreender-se a
constatação da importância do feudo de Princesa, dominado com mão de ferro,
pelo coronel Zé Pereira, o que reverberava com muita influência por todos os
recantos do estado da Paraíba, com relâmpagos pelo Nordeste. Escreve, o autor,
nas páginas 374 e 375:
“(...) a estratégia
pessoístaconsistiu em efetivar política
de seleção, distinguindono coronelismo a parte sadia com que contou para
realização de suas reformas, da outra, que, supraestatal ou arbitrária,
concorria com o Estado, tendo como centro de gravidade a cadeia coronelística
articulada por José Pereira. Dessa cadeia, estruturada em termos de vassalagem
não apenas política, mas econômica e financeira, por conta de empréstimos
contraídos junto ao chefe princesense, faziam parte os coronéis José Queiroga
de Pombal, Duarte Dantas de Teixeira, José Brunet de Misericórdia, Pedro
Firmino de Patos, Nilo Feitosa de Monteiro, João Agripino de Brejo do Cruz e os
Suassunas de Souza/Catolé do Rocha, aos quais
Joaquim Inojosa acrescenta Cunha Lima em Areia, Manuel Borges de Mogeiro,
Duarte Lima em Serraria, Antônio Pereira de Misericórdia, e o deputado/padre
Manuel Octaviano de Piancó”.
O governo de João
Pessoa foi renovador em tudo, principalmente quantos às reformas administrativa
e tributária. Na primeira, o novo presidente imprimiu, no período que compreendeu
1928/1930, uma reestruturação da sociedade “partindo da supremacia do setor
público. Primeiro, ateve-se a modificações profundas na relação
Estado/Municípios, quando determinou o fim da prática autônoma da administração
municipal. Encontramos na página 362:
“(...) o governo João Pessoa atacou o
problema das Prefeituras Municipais, dentro doduplo objetivo de racionalizá-las
incorporando-as à nova sistemática institucional e retirá-las da órbita do
coronelato”.
Em substituição ao que
João Pessoa chamava de “factótuns dos
sátrapas locais”, considerados figuras decorativas, o presidente escolheu, para
administrar os principais municípios do Estado, médicos, sacerdotes, bacharéis,
“capazes de colaborarem numa vida nova de organização e de progresso”. Somente
em Princesa não se efetivou a substituição. Com a exoneração do prefeito e do
vice-prefeito, José Frazão de Medeiros Lima e Glycério Florentino,
respectivamente, ficou a cidade acéfala, por não encontrar, o presidente, “um
só nome para exercício da prefeitura, à revelia do Coronel José Pereira Lima”.
Todos em Princesa, rezavam na cartilha de Zé Pereira.
O coronel de Princesa,
segundo Arruda Mello, era tido como um porta-voz dos demais coronéis junto aos
governos do Estado e da República, e se afirmava como tal não somente no
interior da Paraíba, mas abrangendo o estado de Pernambuco e parte do Nordeste.Completa,
acrescentando observação de Lyra Pacheco, “que o viu envolvido por ‘uma auréola
de respeito, estima e admiração popular’, bem como senhor de prestígio que ‘de
há muito transpôs as fronteiras de seu município’”.
Nesse importante
trabalho, José Octávio de Arruda Mello, realça a determinação do presidente
João Pessoa em fustigar, de forma acintosa, aqueles próceres do partido epitacista
com o intuito de retirá-los, definitivamente, da cena política. O que se denota
disso, é que o novo presidente da Paraíba tinha a intenção de estabelecer nova
liderança política, sob sua égide, excluindo todos os que pudessem fazer-lhe
alguma sombra e isso, com uma pitada de provocação. Consoante esse pensamento
de Pessoa, o autor escreve, nas páginas 384/385:
“Isso acontecia porque João Pessoa
não se encontrava apenas subordinando Delegados de Polícia a sua autoridade
para minar os alicerces do caciquismo. Para áreas mais sensíveis à dominação
dos coronelismos supraestatal e arbitrário (Princesa, Teixeira, Catolé do
Rocha), o presidente achava-se designando delegados incompatibilizados com as
chefias locais, o que se patenteou no tocante a Ascendino Feitosa, em face dos
Dantas, em Teixeira e Manuel Arruda diante de José Pereira em Princesa. Manuel
Arruda confirmou isso quando lembrou o diálogo com o Chefe de Polícia
Archimedes Souto Maior, a quem fez sentir a impossibilidade de seguir para
Princesa, em face de antigas fricções com José Pereira, obtendo como resposta:
‘´É exatamente por isso que lhe estamos mandando para lá’”.
Diferente do constante
em outras publicações de sua lavra, José Octávio dispensa, nessa obra, um
tratamento mais maneiro ao coronel José Pereira. Não o nomina de chefe de
cangaceiros, bandido ou trabuqueiro. Na página 386, o autor escreve sobre a
situação de Princesa insurreta, com as seguintes palavras:
“É que Princesa, mesmo com as
atividades afetadas pela irrupção do conflito, em primeiro de março de trinta,
não se converteu em terra de ninguém. Com segura intuição de organização político-administrativa,
embora situada pelo ângulo privado da
autoridade caudilhesca, José Pereira Lima não permitiu que o território sob sua
liderança se transformasse em algo acéfalo, sem qualquer controle
político-social e administrativo”.
Realça ainda a
preocupação do coronel princesense em comunicar, através de telegramas às
autoridades eclesiásticas (o bispo Dom Moisés Coelho e o arcebispo Dom Adauto
Aurélio de Miranda Henriques), “que
jamais consentiria em atos de vandalismo contrários à moral cristã”. Em 06
de maio de 1930, José Pereira concedeu entrevista ao Jornal do Commercio, de Recife: “(...)
não só dentro do município que até hoje administro como os demais lugares onde
se está reflectindo a minha acção moralizadora, todas as garantias que a lei
constitucional nos oferece”.Segundo o guarda fiscal, Juvenal Simões Coelho,
que esteve em Princesa durante o conflito, em depoimento ao jornal A UNIÃO: “A resistência (...) está na presença indispensável desse homem na
cidade. José Pereira só poderá manter a sua gente em guerra, estando no meio
dela. É o corpo e a sombra”. Consoante depoimento do princesense, Zacarias
Sitônio, que vivenciou os acontecimentos de 1930, a preocupação pereirista era:
“exercida com força total e subordinada à
verdadeira magia do coronel que exercia absoluto controle e disciplina sobre a
população de Princesa”.
Nas páginas 388 e 389,
José Octávio discorre sobre a situação de Princesa no decorrer da guerra:
“Verdade que de março a julho de
trinta, a arrecadação de impostos princesense foi suspensa, a justiça regular
deixou de funcionar e, enquanto durou a luta, ninguém trabalhou, quer no campo,
indústria (beneficiamento de algodão, curtumes) ou nas casas comerciais, sendo
as aulas interrompidas após a segunda semana de operações. Em compensação, a
feira continuou a realizar-se ‘com abundância de cereais e frutas’ e a estação
telegráfica prosseguiu com serviços regulares. (...) O abastecimento, via
Triunfo e Rio Branco, foi enfrentado satisfatoriamente (...), montou-se um
hospital de sangue com dois médicos na própria casa do coronel, e a usina que
fornecia energia elétrica continuou a gerar normalmente”.
Demonstra isso, a
liderança inconteste do coronel José Pereira, a organização da luta e,
principalmente a disciplina e os cuidados, tanto com a população da sede do
município, quanto com os que estavam nas frentes de batalha. É sabido que o
primeiro tiro da Guerra de Princesa, é questionado por muitos, sobre quem o
deflagrou. Mas, hoje, passados 90 anos, arrefecidas as paixões e olhado, aquele
episódio, com isenção, constata-se que o conflito foi sim provocado pelo
presidente João Pessoa, quando da invasão de Teixeira. É claro que o coronel e
seus amigos do Recife (Pessoa de Queiroz), já esperavam por isso e já estavam
preparados para uma reação à altura. Não foi sem saber que as tropas de Zé Pereira
acudiram, imediatamente, os Dantas na Vila de Teixeira, contra a ofensiva
comandada pelo tenente Ascendino Feitosa. Na verdade, o intuito do presidente
paraibano, era impedir ou, no mínimo, tumultuar as eleições na região comandada
pelo coronel José Pereira, que era também, deputado estadual.
Quanto às eleições de
1º de março de 1930, mesmo o governo do Estado havendo negado sua realização em
Princesa, sob a alegação da falta de segurança, o pleito aconteceu normalmente
e em perfeita ordem e tranquilidade. Nas páginas 396 e 397, Arruda informa que
os candidatos da Aliança Liberal não conseguiram um só voto no município
rebelado. Conforme telegrama de 3 de março de 1930, expedido de Princesa por
Richomer Barros, encarregado da Estação Telegráfica, ao Chefe da Central Telegráfica,
no Rio de Janeiro, os resultados das eleições princesenses, para presidente da
República, foram os seguintes: Júlio Prestes-Vital Soares, 1.001 votos. Getúlio
Vargas-João Pessoa, zero votos.
Não será essa
resumidíssima resenha que dará ciência da importância dessa magnífica obra. É
livro para se ler e reler. É obra para ser estudada. O que aqui apresentamos é
um aperitivo, uma entrada estimuladora para o conhecimento do todo. Sem
paixões, o autor discorre sobre os fatos que envolveram Princesa naquele
importante movimento revolucionário (1930) que mudou o Brasil, o que,
consequentemente, coloca Princesa no contexto da Revolução de 30 como elo de
muita importância. Daí a necessidade do conhecimento desse trabalho, para
melhor conhecimento e compreensão da história.
José Octávio de Arruda
Mello nasceu em João Pessoa em 18 de março de 1940. É historiador, jornalista e
professor do Brasil. Bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela
Faculdade de Direito da Paraíba, posteriormente graduou-se em História, também
pela UFPB. Obteve o título de doutor em São Paulo. É membro do IHGP – Instituto
Histórico e Geográfico da Paraíba e da APL – Academia Paraibana de Letras. É
autor de vários livros sobre história, política, sociologia, etc. Atualmente,
reside na Capital paraibana.
Nenhum comentário:
Postar um comentário