ODE

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Eu tenho pena de Deus

Antigamente quando o conservadorismo, de forma institucional, comandava a sociedade como um todo, havia mais respeito à figura de Deus. É paradoxal, mas a convivência do Divino com a modernidade o fez menor, vulgar e banal. Em todas as atividades vimos e ouvimos a invocação do Seu nome de forma simplista como se fora o “Criador” algo de menor importância, uma marca, uma mercadoria que serve como lenitivo a tudo o que não presta.

Se escutamos uma entrevista de um jogador de futebol, escutamos o indefectível “grazadeus”; quando alguém tem um plano, mesmo que não esteja nos planos de Deus, ouvimos o interessado dizer: “se Deus quiser vai dar certo”. Tudo, ou quase tudo, traz o nome do Ser supremo à baila como se fora Ele um joguete nas mãos ou nas bocas dos interessados em se dar bem. Imagine, o leitor, que no Congresso Nacional, existe a “bancada evangélica”, ou seja a turma formada por aqueles parlamentares que professam, de forma oportunista, a religião cristã e atuam em conjunto com a “bancada bala” configurada pelos que defendem a disseminação de armas de fogo.

Políticos inescrupulosos, via de regra, encerram sempre suas entrevistas dizendo: “fiquem com Deus e até outra oportunidade”. O próprio presidente da República, o mesmo que em seu negacionismo durante a grave pandemia que atravessamos, quando nega a eficácia da vacina e exulta o uso de medicamentos comprovadamente ineficazes - o que pode ter causado grande parte das quase 630 mil mortes -, tem como lema de sua administração, o slogan: “O Brasil acima de todos e Deus acima de tudo”. Isso exercitado sempre sem o mínimo senso moral.

Andam inclusive, os ditos representantes de Deus aqui na terra, na contramão um do outro. Enquanto o Papa Francisco defende a inclusão religiosa de homossexuais, mulheres e minorias raciais, alguns dos pastores evangélicos, sob o manto de um conservadorismo conveniente e hipócrita, são homofóbicos, misóginos e racistas. Basta ver a declaração do Ministro da Educação, o senhor Milton Ribeiro, quando afirmou serem, os homossexuais, filhos de famílias desajustadas, tudo isso com o aval do chefe. É paradoxal a exaltação do nome de Deus concomitante com a insensibilidade quanto às agruras do povo.

Heresia maior não há do que o uso do nome de Deus por políticos quando, no exercício de suas contumazes hipocrisias misturam o Divino com votos. Exemplo disso foi uma recente declaração do presidente da República quando disse: “Hoje, o Brasil tem um presidente que acredita em Deus”. Verdade? Ele acredita tanto Nele, que em busca de votos, se fez batizar duas vezes por duas Igrejas Evangélicas distintas. Essa mistura, ofende ao princípio da laicidade do Estado. O que tem Deus a ver com a política ou com a administração pública?

O problema se agrava quando não se atém somente à política, ao futebol ou ao cotidiano das pessoas crédulas. O acinte se exacerba quando nos deparamos com situações as mais desrespeitosas. Quem já não observou que em todo pescoço de um pistoleiro (por exemplo), está dependurado um crucifixo ou um rosário da Mãe de Deus? Quem não sabe (se já não viu), que em quase todas as repartições públicas, no Brasil, existe também um crucifixo dependurado na parede principal? E nos quartos dos cabarés? Quando não um Cristo pregado na cruz, há um quadro com o retrato do Sagrado Coração de Jesus, hábito que se repete em quase todas as casas comercias, inclusive nas destinadas aos divertimentos mais escusos. Se pelo menos dependurassem o Cristo sem estar com as mãos pregadas, talvez, pudesse Ele tomar alguma providência. Diante dessa banalização do Sagrado e dessa falta de respeito, confesso: Eu tenho pena de Deus.







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