Jejum eleitoral
Trinta anos após a escuridão da ditadura militar, foram
realizadas as primeiras eleições diretas para a escolha do presidente da
República no Brasil. Com o Golpe perpetrado pelas Forças Armadas em 31 de março
de 1964, cessaram as liberdades democráticas no Brasil. Foram suspensas as
eleições para presidente; várias lideranças políticas tiveram seus mandatos
cassados; a tortura instalou-se nos porões dos quarteis do Exército, da Marinha
e da Aeronáutica, tudo ficou turvo. O jejum de eleições presidenciais durou
quase 30 anos, uma vez que o último pleito para a escolha do presidente da
República havia acontecido em 1960 quando da eleição do presidente Jânio
Quadros.
Nova Constituição
Em 1985, após a rejeição pelo Congresso Nacional, em 1984, da
Emenda Constitucional - de autoria do então deputado Dante de Oliveira -, que
reinstituía as eleições diretas para presidente da República, as oposições se
uniram num consenso e elegeram, indiretamente por um Colégio Eleitoral, o
político mineiro Tancredo de Almeida Neves, presidente do Brasil. Antes de
tomar posse, o presidente-eleito adoeceu e morreu quarenta dias depois de
eleito. Com a vacância, assumiu o vice-presidente, José Sarney. Após a eleição
do novo parlamento, em 1986, foi escrita uma nova Constituição Federal que,
promulgada em 05 de outubro de 1988, previa no seu texto a realização de
eleições diretas para a escolha do no presidente com data marcada para 15 de
novembro de 1989, exatamente cem anos após a proclamação da República
brasileira.
A “zebra” das Alagoas
Para as eleições de 1989, a união das oposições não se
repetiu. O longo jejum eleitoral provocou na maioria das lideranças políticas
brasileiras a avidez de concorrer ao cargo maior da Nação. A falta de consenso
fez surgir 21 concorrentes à presidência. Entre estrelas de primeira grandeza
na qualidade de Ulysses Guimarães; Mário Covas; Aureliano Chaves; Leonel
Brizola, dentre outros, figuravam também alguns “marronzinhos” e outros que,
pelo seu radicalismo ideológico (Lula; Roberto Freire; Fernando Gabeira), não
se apresentavam com nenhuma chance de vitória. Face à miscelânea de postulantes
desprovidos de propostas que tivessem o condão sensibilizar ou de atrair os
eleitores, surgiu a “zebra” das Alagoas, pintada de verde-amarelo, descendo o
pau no presidente Sarney, prometendo derrubar a hiperinflação de um Ippon
(golpe de caratê) e com o simpático discurso de “Caçador de Marajás”. Essa
“zebra” tinha um nome: Fernando Affonso Collor de Mello. Isso mesmo, tudo
dobrado que nem tapioca. Dobrou a todos e, no meio do processo eleitoral já se
apresentava como favorito a lograr êxito nas urnas de 15 de novembro.
A república das Alagoas
Não deu outra! Polarizando com outra “zebra”, como nome de
Luís Inácio da Silva, o Lula, que surgira das esquerdas, respaldado pelos
sindicatos e que teve o “mérito” de destronar aquele que oferecia maior perigo
ao stablishment, chamado Leonel
Brizola, os donos do capital junto aos de pensamento conservador, optaram pelo menos
ruim, pelo menos perigoso. Com isso, Fernando Collor angariou apoios vários que
o levaram à principal cadeira do Planalto, quando derrotou Lula no segundo
turno daquelas eleições. Eleito, Collor instalou-se no governo acompanhado de
uma turma, a maioria de seus componentes vindos de Alagoas, seu estado de
origem, e começou a governar num estilo ufanista, arrogante e por demais
presunçoso. Inicialmente, a população apostou no novo, porém, aos poucos foi
ficando demonstrado o conto do vigário em que havia caído, a maioria dos
brasileiros.
O fim da farsa
No começo tudo era festa. Veio o chamado “Plano Collor” que,
sob o pretexto de acabar com a inflação confiscou as poupanças de forma
indiscriminada; congelou salários e preços e não conseguiu explicar nada a
ninguém. Enquanto o presidente Collor corria nas imediações da “Casa da Dinda”
(casa que pertencera à sua avó e que adotou como residência oficial), a
inflação - que fora abatida artificialmente -, voltava a subir de forma mais
agressiva ainda. Na esteira desse e de vários outros fracassos administrativos,
o irmão do presidente, Pedro Collor de Mello, enciumado tanto por motivos
negociais quanto amorosos, deu entrevista-bomba à revista Veja, denunciando o
tesoureiro da campanha eleitoral de Fernando Collor, Paulo César Farias, como
sendo este o operador da corrupção que grassava no palácio do Planalto.
Instalada uma CPI – Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara Federal, logo se
constatou que as denúncias do irmão tinham fundamento e que havia mesmo falcatruas
no governo do “Caçador de Marajás”. Instalado o processo de impeachment, correu tudo dentro do que manda a lei e o presidente foi afastado
pela Câmara Federal, para ser julgado pelo Senado da República. Vendo que seria
mesmo condenado e defenestrado do poder, Fernando Collor de Mello renunciou ao
mandato de presidente da República em 29 de dezembro de 1992. Foi esse o fim do
governo saído das urnas da primeira eleição direta pós ditadura militar. De lá
para cá têm acontecido coisas que, se comparadas com as que derrubaram Collor
do trono do Planalto, constataremos que aquelas são “fichinhas” em relação às
de hoje. E o Brasil, mesmo aos trancos e barrancos no âmbito da política, segue
impávido.
(Escrito por Domingos Sávio Maximiano
Roberto, em 15 de novembro de 2019).
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