SIGNOS EM CONFRONTO? O
Arcaico e o Moderno na Cidade de Princesa (PB) na Década de 1920.
SERIOJA RODRIGUES CORDEIRO MARIANO
O livro de Serioja Mariano, lançado pela Editora da
Universidade Federal da Paraíba, em 2010, com 164 páginas, é o escrito mais
completo e mais abrangente já divulgado sobre o município de Princesa. O foco
da narrativa são os anos da década de 1920 - período mais importante da
história recente de Princesa. Adentra no cotidiano das pessoas e nos costumes
da época; traz depoimentos de pessoas (principalmente de mulheres), que foram
testemunhas oculares dos ocorridos naquele importante espaço de tempo. É
leitura indispensável e necessária para aqueles que desejam compreender
Princesa sobre qualquer aspecto, seja ele social, econômico, político, etc.
O título da obra já sugere a sua essência. Em análise
simples, o confronto do novo de repente chegado, com o velho arraigado nas
tradições; o desconforto do apartamento do que era a praxe tradicional com o
supetão da mudança provocada pelo moderno. Já na apresentação do trabalho, assinala,
a autora:
“(...) verificou-se que a chegada das
chamadas invenções modernas alterou profundamente o cotidiano da população
princesense. A modernidade chegou construindo seus labirintos, mudando hábitos
sociais, comportamentos e sensibilidades, não com a mesma velocidade de outras
cidades brasileiras, mas ao seu modo e dentro de sua multiplicidade. Apesar da
marcante presença da tradição, o novo e o velho coexistiram com suas
contradições, fazendo parte da história da cidade”.
Foi nessa década de ouro [1920/30] que chegaram a Princesa as
novidades que já faziam o deleite das grandes cidades do País. Sobre essa
modernização, escreve Serioja (p.59):
“A cidade prosperava. De uma economia
baseada na agricultura e no criatório, em que o campo se sobressaía, Princesa
cresceu e passou por um processo acelerado de modernização, com a alta da
economia algodoeira. Transformou-se velozmente. Adquiria ares de moderna, com a
construção de casas, ruas, praças, e melhoramentos de estradas; a chegada da
iluminação elétrica; concessionária de automóveis e agências de bancos”.
Em seu discurso inicial, Serioja, aborda sobre a importância
histórica de Princesa: “Uma cidade que
sempre foi conhecida na historiografia brasileira através do aspecto político,
em virtude da chamada Revolta de Princesa (1930)”. Acrescenta que Princesa:
”(...) tem uma espacialidade diferente,
tem a sua singularidade, com uma duração de tempo que difere de outras cidades
do Brasil que, de certa forma, representam cenários de modernidade”.
Na divisão capitular da obra, a autora, nas três partes do
livro, discorre sobre “As Origens da Cidade: Lagoa da Perdição, Bom Conselho e
Princesa”; “As inquietações Intelectuais e o Modernismo em Princesa” e, “1930:
O Ano em que a ‘Modernidade’ Acabou?”. Às páginas 90 e 98, Mariano, realça fato
da maior importância, que orgulha a todos os princesenses, uma vez haver sido, Princesa,
o único município do interior do Nordeste a aderir, de forma efetiva, ao movimento
modernista que eclodiu com a Semana de Arte Moderna, ocorrida em São Paulo em
1922:
“Em meio a toda essa agitação
cultural foi criado (em 1925) na cidade de Princesa o Grupo Literário Joaquim
Inojosa, uma ‘Sociedade de Letras’ em homenagem ao divulgador do modernismo em
Pernambuco e de quem o fundador, o poeta e professor Emídio de Miranda, era
admirador”.
Acerca disso, a autora registra entrevista colhida de dona
Hermosa Sitônio, que vivenciara aquele momento:
“(...) o coronel Zé Pereira era muito progressista trouxe um professor
que era do Recife, mas ele morava em Serra Talhada (...) um rapaz poeta como
Castro Alves e nós éramos alunos dele. Então aí veio o movimento modernista de
22 e ele [Miranda] era amigo, quer dizer, admirador e botou o nome do grupo de
Joaquim Inojosa (...) aí ele fez do grupo, um movimento conhecido como
intelectual meio revolucionário para a época (...)”.
Registro importante, faz Serioja Mariano – o que tem
referência também no livro: República de
Princesa, de Joaquim Inojosa (já resenhado nesta série) -, sobre os signatários de uma carta
enviada a Joaquim Inojosa comunicando a este, a fundação do Grêmio Literário,
em 17/05/1925, que leva seu nome. São os seguintes os intelectuais
princesenses, fundadores da referida “Sociedade de Letras”: Emídio de Miranda,
José Cypriano Maracajá, Manoel Monteiro Diniz, José Vieira de Mello, João
Maximiano dos Santos, Manoel Francelino de Sousa, Zacarias Sitônio, Renato de Freitas,
Epaminondas Monteiro Diniz, Cláudio Pinheiro Santos, Manoel Lima e Bellarmino
Medeiros.
Quando se refere à guerra de secessão, em que se envolveu
Princesa, em 1930, contra a polícia paraibana - situação em que, rebelado, o
município decretou sua independência do estado da Paraíba, criando o
“Território Livre de Princesa”-, Serioja discorre sobre o caricato Decreto, sua
leitura na Câmara dos Deputados, no Rio de Janeiro e a repercussão no Brasil.
Além disso, faz interessante referência ao livro do intelectual paraibano,
Ariano Suassuna: O Rei Degolado ao Sol da
Onça Caetana (1977, p.52):
“(...) Princesa, rebelada contra o
Estado da Paraíba, manteve-se independente, com hino, constituição, bandeira,
jornal e tudo! Pois, assim como José Pereira dominava uma porção do território
brasileiro e aí instalou o seu Reino, eu também domino atualmente uma parte e
vou instalar, nela, minha República Popular do Brasil, desmembrada e
independente da outra, a reacionária”.
Interessantes também são os depoimentos colhidos de “três
senhoras com aproximadamente oitenta anos de idade cada e que narram suas
histórias de vida”. Esses depoimentos narram a saída das famílias, da Princesa
conflagrada, para as cidades vizinhas de Flores e Triunfo; a coragem de dona
Toinha Carlos, mandona, “mulher cangaceira”; o embarque dos cabras de Zé
Pereira para o campo de luta; o voo rasante do avião que veio bombardear
Princesa; sobre o mandonismo incontestável e o endeusamento do coronel José
Pereira, pelos princesenses da época, dentre outras histórias.
Às páginas 142 e 143, a autora escreve sobre o declínio a que
Princesa foi submetida após a guerra, quando o comércio fechou suas portas; a
produção do algodão sofreu grande queda; os negócios dali saíram para outras
praças: “A cidade que, antes do fatídico
ano de 1930, viveu sua fase áurea, com intensificação do crescimento urbano,
não era mais a mesma. Princesa parecia ter entrado em um sono profundo e
duradouro, não havia mais diversões e a vida social sofreu”. Acrescenta
que, o cinema fechou, o campo de futebol fechou, as apresentações teatrais
desapareceram para sempre e que sobreviveu ao ano de 1930, apenas a festa da
padroeira Nossa Senhora do Bom Conselho, o futebol o carnaval e as festas
juninas.
No livro, Signos em
Confronto?...”, a jovem escritora princesense se supera. Trabalho com
método, baseado em rigorosas pesquisas, porque resultado final de sua
dissertação de mestrado, defendida em 1990, encerra informações importantes,
inéditas, portanto profícuas para o entendimento da evolução da sociedade princesense.
Antes do trabalho literário em tela, somente seu pai, Paulo Mariano, havia
abordado o assunto, no livro: Princesa,
Antes e Depois de 30, porém, de forma sucinta e superficial. O livro de
Serioja Mariano é o primeiro trabalho a tratar sobre aspectos da evolução de
Princesa, nos campos da cultura, dos costumes, da economia e até da política,
com acurada competência, riqueza de informações e vasta iconografia. Leitura
indispensável.
Serioja Rodrigues Cordeiro Mariano, nasceu em Princesa, em 26
de março de 1969, é filha do escritor e historiador princesense, Paulo Cordeiro
e Silva Mariano e de dona Terezinha Rodrigues Cordeiro, viúva de João Azevedo
Fernandes e mãe de Paulo. É professora do Departamento e do Programa de
Pós-Graduação em História da Universidade Federal da Paraíba; foi professora da
Universidade Estadual da Paraíba entre 2003 e 2007; fez doutorado (2005) e
mestrado (1999) em História do Brasil, pela Universidade Federal de Pernambuco,
e Graduação em História (1995) na Universidade Federal da Paraíba. Atualmente
coordena o grupo de Pesquisa “Sociedade e Cultura no Nordeste Oitocentista”,
área em que desenvolve pesquisas e artigos. Mora na capital paraibana.
DSMR, em 03 de fevereiro de 2021.
Querido Dominguinhos, obrigada pela leitura cuidadosa e as belas palavras sobre o meu livro, vindo de você fico lisonjeada. Já estou na segunda edição do livro. Um grande abraço.Serioja
ResponderExcluirQuerido Dominguinhos, obrigada pela leitura cuidadosa e as belas palavras acerca do meu livro, vindo de você fico lisonjeada. Já estou na segunda edição do livro. Um grande abraço.Serioja
ResponderExcluirExcelente matéria, uma abordagem competente a respeito de uma obra escrita por quem se aprofundou no assunto e tem o domínio da escrita. O DNA do pai.
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