ODE

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

LER PARA CONHECER A NOSSA HISTÓRIA

 



“JOÃO PESSOA – O sentido de uma vida e de uma época”

O livro, escrito por Epitácio Pessoa Cavalcanti de Albuquerque (Epitacinho), filho do presidente, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, intitulado: “JOÃO PESSOA – O sentido de uma vida e de uma época”, lançado pela Editora Acauã Ltda., em 1979, traz, em seu bojo, o depoimento do filho mais velho do desditoso presidente, escrito apenas 12 anos após os acontecimentos de 1930. Como toda obra referente àquele conturbado período da história paraibana, esse trabalho traz referências importantes sobre a Guerra de Princesa, o que, para muitos, foi o estopim da Revolução de 1930. É claro que, por quem foi escrito, esse livro sofre também de certo facciosismo, quando mascara alguns fatos, dá a outros, realce exagerado e, em alguns momentos, falta com a verdade ou conceitua, erroneamente, algumas personalidades. Já na apresentação da obra, o filho de Epitacinho, João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque Neto, anota, a página X, sobre seu avô: “A este pequeno grupo de caluniadores (...) que buscam por todos os meios ao seu alcance (...) denegrir a memória de um homem, que covardemente assassinado pelas costas, soube cair de pé, imolando sua vida em holocausto à liberdade(...)”. é sabido por todos que o presidente João Pessoa, assassinado pelo advogado João Duarte Dantas, não o foi pelas costas. Na mesma apresentação, Pessoa Neto, agradece a várias personalidades paraibanas, inclusive ao princesense, doutor Antônio Nominando Diniz, a quem se refere, de forma exagerada: “Deputado Dr. Antônio Nominando Diniz (filho do herói de Princesa Isabel, Nominando Muniz Diniz e continuador de sua luta)”.

No prólogo desse trabalho, escrito pelo então presidente da República, Getúlio Vargas, em plena vigência da ditadura do Estado Novo, vale transcrever dois parágrafos dessa parte inicial. Excerto das páginas XV e XVI:

“(...) Como isso não bastasse, para abater-lhe o ânimo de lutador [João Pessoa], oficializou-se o cangaço no reduto de Princesa, a fim de obrigá-lo a capitular pela força ou à míngua de recursos. Enquanto sobejavam aos desordeiros os elementos bélicos que, abundantemente, lhes fornecia o Governo da União e dos Estados vizinhos, impedia-se-lhe a aquisição e recebimento de armas e munições, legitimamente destinadas à manutenção da ordem e à defesa da autoridade legal. Assistimos, assim, a este espetáculo: O Governo Federal cuja função precípua é manter a ordem em todo território da República, convertera-se em instigador e protetor da desordem, negando-se a reconhecer ao poder constituído de um Estado da Federação a faculdade elementar de defender-se.

Foi nessa situação extremamente delicada, quando João Pessoa ainda resistia, impávido, à arremetida subversiva que o sitiava, tentando manter-se escudado na lei, dentro da ordem; foi nesse transe decisivo, capaz de acelerar a reação nacional já em marcha, que a morte o surpreendeu, emboscada na traição e inspirada em torva vingança”.

Interessante observar, nesse escrito do ex-presidente, que o próprio reconhece que já estava em marcha: “(...) a arremetida subversiva (...) capaz de acelerar a reação nacional”. Ou seja, Getúlio Vargas admite que a Guerra de Princesa, por si só, já seria suficiente para provocar um levante nacional, a Revolução de 30!

Na página 49, o autor faz uma referência a outro princesense ilustre: Alcides Vieira Carneiro. Durante a campanha eleitoral para a escolha do presidente da República, nas eleições de 1º de março de 1930, em que figurava na chapa, João Pessoa, como candidato a vice de Getúlio Vargas, em meeting (comício), realizado em Fortaleza/CE, Alcides foi designado para fazer a saudação inicial e, por ordem do presidente (governador) do Ceará, José Carlos de Matos Peixoto, foi impedido de continuar seu discurso, quando a cavalaria dissolveu a multidão, causando tumulto e várias mortes. Interessante observar que, Alcides Carneiro, em que pese ser amigo e afilhado do coronel José Pereira, mesmo com o rompimento deste com a Aliança Liberal, continuou aliancista e defensor das candidaturas de oposição ao Catete.

Na página 53, o livro traz uma informação interessante. Por ocasião da visita do presidente João Pessoa a Princesa - em seu périplo para divulgação de sua candidatura a vice-presidente da República -, este foi recebido com grande festa e saudado, em um discurso, proferido pelo cunhado de José Pereira, Inocêncio Justino, na casa do coronel, após o jantar. Está nessa obra, reproduzido, ipsis litteris, o discurso:

“Orgulhosos, assim em hospedar o ilustre co-estaduano que nos governa, os princesense reafirmam a V. Excia. a sua absoluta solidariedade, pedindo que na Vice-Presidência da República, junto ao futuro Presidente Getúlio Vargas, V. Excia.  Não esqueça as necessidades da nossa terra”.   

Acrescenta, o autor: “(...) na excursão política que o governante paraibano empreendeu ao interior de seu Estado, Princesa foi o município que maiores manifestações lhe tributou”.

Com relação à Guerra de Princesa, dando conta de haver sido esse movimento bélico o principal fato provocador da Revolução de 1930, o autor assinala, na página 60:

“O CASO DE PRINCESA – Este é, sem dúvida, o ponto principal da luta política que antecedeu o movimento de regeneração nacional deflagrado a 3 de Outubro de 1930 e que vinte e um dias depois faria degringolar o império da violência, do suborno, da fraude e do despotismo que assinalou o último quatriênio da velha República”. “(...) Veremos, igualmente, como o primeiro magistrado da nação [Washington Luís] apoiou e alimentou até o fim, a sublevação da ordem em determinado ponto [Princesa] do território nacional”.

No livro, o filho do presidente João Pessoa, se refere à luta de Princesa como, “Masorca”; aos que lutaram ao lado do coronel José Pereira, como cangaceiros e bandoleiros. A página 147, afirmando o apoio do presidente da República à insurreição de Princesa, Epitacinho escreve:

“Perdendo, a cada hora, a noção da dignidade da sua magistratura, ele [Washington Luís] se colocou, sem rebuços, ao lado dos bandoleiros, dispensando a estes, no decorrer de todas as fases da luta, a mais eficiente e desvelada assistência, não trepidando, sequer, em corresponder-se, com o chefe [José Pereira] da masorca, a quem dava, sem intermediário, suas ordens cruéis e arbitrárias”.

 

Quanto ao assassinato de seu pai, o presidente João Pessoa, o autor, num devaneio emocional de filho, assertiva que o crime perpetrado na “Confeitaria Glória”, foi fruto de um complô que envolveu, além do presidente Washington Luís, do governador do estado de Pernambuco de várias personalidades políticas da Paraíba e de alguns empresários pernambucanos. Escreve a página 71:

“Da conjura que se formou na capital pernambucana, entre João Suassuna, Júlio Lyra e irmãos Pessoa de Queiroz, conjura a que não podia ser estranho o próprio presidente da República, e à sombra do governo do sr. Estácio Coimbra, nasceu o plano monstruoso para abater o símbolo da bravura e da resistência do povo paraibano contra o arbítrio e as torpezas do senhor Washington Luís”

Na página 148, o autor se refere a Álvaro de Carvalho - vice-presidente da Paraíba que, com a morte de João Pessoa, assumiu o governo do Estado -, de forma injusta, como: “(...) um débil moral que assumira o governo na qualidade de Vice-Presidente do Estado, mandou policiar a capital pelas forças do Exército sabendo que isso sempre repugnara ao homem que momentos antes tombara em Recife por amor da sua terra e em defesa dos seus brios”

Por demais necessário o conhecimento do contido neste livro, pois, nos dá luz quanto ao facciosismo sobre o relato da história recente da Paraíba, e também, a corroboração da importância de Princesa quanto à eclosão da Revolução de 1930. Muito do que foi escrito com exacerbada emoção, já foi dirimido, porém, muito ainda tem de ser dito para resgatar algumas verdades. Somente usando o instrumento da pesquisa, chegaremos a conhecer, senão completamente, pelo menos parte das verdades escondidas ao longo do tempo.

Epitácio Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, nasceu no Rio de Janeiro, em 22 de junho de 1911. Era filho de João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque e de dona Maria Luísa Pessoa Cavalcanti de Albuquerque. Casou-se com dona Ana Clara. Bacharelou-se, em 1937, pela Faculdade de Direito do Rio de Janeiro. Político, jornalista e empresário, foi dono do jornal “Folha Trabalhista” editado na Capital paraibana. Eleito suplente de senador, assumiu o cargo pela renúncia do titular, Adalberto Ribeiro, e faleceu no exercício do cargo de senador da República, no Rio de Janeiro, em 24 de agosto de 1951. Além desta obra, aqui resenhada, o autor publicou mais três livros.

DSMR, em 19 de fevereiro de 2021.

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