Foi em 1893, quatro anos após a Proclamação da República, que
aconteceu um dos conflitos mais emblemáticos da História Nacional. No Sertão da
Bahia, guiados por um fanático líder religioso, chamado Antônio Vicente Mendes
Maciel que, perambulando pelos sertões nordestinos, vindo do Ceará, pregando
costumes conservadores, mais especificamente contra a nova ordem republicana,
em seu périplo, aliciou vários adeptos que, fanatizados, se submeteram aos
ensinamentos e conselhos desse líder, que passou a ser apelidado de Antônio
Conselheiro, o que culminou com a Guerra de Canudos.
Aportando no lugar chamado Belo Monte, às margens do rio
Vaza-barris, Antônio Conselheiro, nascido em Quixeramobim, no Ceará, fez
edificar o Arraial de Canudos, no sertão baiano e ali se estabeleceram milhares
de agricultores pobres que, sob sua orientação, ocuparam vasta área de terras
improdutivas pertencentes a ricos latifundiários, ali, fundaram uma verdadeira
cidade composta de casebres construídos de forma tosca, com varas e palhas de
coqueiros. Edificaram um templo, em alvenaria, para suas orações, onde recebiam
também as ordens de costumes determinadas pelo Conselheiro.
O líder, não era um analfabeto ignorante, mas sim um caixeiro
viajante que virou professor e escrivão. Para aquele tempo, era um homem de
letras. Muito conservador e religioso, era contra a recém-implantada República.
Para Antônio Conselheiro, a nova ordem política – que derrubou a Monarquia e
dom Pedro II -, era uma profanação pelo fato de haver estabelecido a eleição
dos governantes sem o aval da Igreja Católica; o casamento civil; a cobrança de
impostos e a separação da Igreja do Estado.
Em 1893, sob o comando de Antônio Conselheiro, se estabeleceu
a desobediência civil quando, em provocação às autoridades, os moradores do
Arraial de Canudos queimaram documentos oficiais em um ato de rebeldia contra a
cobrança de impostos. Para o líder religioso, o único imposto que poderia ser
cobrado, era o dízimo constante nos Evangelhos. Conselheiro pregava contra a
República, chamando-a de “o verdadeiro Anticristo”.
A ordem social mantida no Arraial, obedecia a parâmetros
similares ao comunismo: nada era de ninguém e tudo pertencia a todos. Sem
conforto algum, viviam, aqueles milhares de agricultores miseráveis, em
condições ínfimas de higiene e de nutrição. Dormiam no chão e em redes, e se
alimentavam, basicamente, dos derivados do milho e da mandioca. Cultivavam
roças comunitárias, coletivas e autossustentáveis. O próprio Antônio
Conselheiro, tinha costumes austeros: dormia no chão sobre uma esteira feita de
palhas de bananeiras e, mesmo frugal, só se alimentava após as orações
obrigatórias na pequena igreja e, a ordem era para que todos, agissem da mesma
forma. Surtos de doenças eram frequentes e comuns, mas nada abalava a liderança
do Conselheiro. Todos seguiam à risca suas determinações religiosas e de
costumes.
Vendo ali um foco de rebeldia e de desobediência civil e, em
retaliação à queima dos documentos tributários, o governo do estado da Bahia,
atendendo orientação do Governo Federal, determinou um ataque da Polícia
Militar para promover a dispersão daquela horda que subvertia a ordem. A
intentona da polícia baiana não logrou êxito. Em grande número, os
conselheiristas, organizados e determinados em defender seu lugar e suas
ideias, rechaçaram o ataque quando foram mortos 10 soldados, sem o sacrifício de
nenhum dos seguidores de Antônio Conselheiro.
Após esse ataque da polícia, os moradores de Canudos
entenderam que haveria nova investida contra eles. Sabiam que suas agressões à
nova ordem republicana não seriam toleradas pelo governo. Começaram então a se
preparar. Estrategista que era, o líder religioso resolveu se capitalizar com
meios financeiros para enfrentar seus agressores. Determinou a extração de
madeira nas terras que ocupavam e passou a vender grande quantidade desse
produto na praça de Joazeiro (na Bahia). Farto de recursos, providenciou a
compra de armamento e munições, e começou a treinar seus fiéis seguidores no
manuseio de rifles, espingardas e fuzis.
Em fins de 1896 - desta feita sob as ordens diretas do
Ministro da Guerra, Carlos Machado Bittencourt – o governo do presidente
Prudente de Morais determinou a expedição de uma Força do Exército Brasileiro,
composta de 600 homens, para desbaratar os camponeses rebeldes do Arraial de Canudos.
Para tanto, levaram, além de armamento convencional, dois canhões krupp de
fabricação alemã. Mesmo assim, os adeptos de Antônio Conselheiro, venceram mais
essa batalha, quando foram mortos mais de 100 soldados e vários ficaram
feridos. As baixas do lado dos aguerridos agricultores foram de apenas 13
homens.
Diante dessa ferrenha resistência, vendo aí uma ameaça à
República, o Governo Federal resolveu tomar providências mais efetivas. Em
fevereiro de 1897, o comando do Exército designou o coronel Moreira César que,
à frente dessa 3ª Expedição, partindo direto do Rio de Janeiro, comandando
1.200 homens e seis canhões, partiu para Canudos determinado a suplantar
aqueles revoltosos. Mais uma vez os seguidores de Antônio Conselheiro levaram a
melhor. Derrotaram a tropa do Exército, quando dezenas de soldados foram
mortos, inclusive o comandante, Moreira César.
Em pânico com a resistência dos conselheiristas, o Presidente
Prudente de Morais resolveu cortar o mal pela raiz. Em maio de 1897, o ministro
da Guerra nomeou o general Arthur Oscar como comandante de uma tropa composta
por cinco mil homens e 700 toneladas de munição, vários canhões e um canhão especial
com cerca de 3 metros de altura, chamado “A matadeira”. Em junho daquele ano,
as tropas do general Arthur Oscar fizeram várias investidas em Canudos e, sem
lograr êxito, perderam mais de 1000 homens, perdendo todos os confrontos.
Em agosto de 1897, chegaram às imediações de Canudos, mais
três mil soldados em reforço à tropa federal. Arthur Oscar determinou o uso da
“Matadeira” e, após vários combates havidos nos meses de agosto e setembro, o
Arraial de Canudos estava derrotado, com um saldo de milhares de agricultores
mortos. Em 22 de setembro de 1897, morreu Antônio Conselheiro (não em combate,
mas, de disenteria). Quinze dias depois, em 07 de outubro daquele ano, existiam
apenas cerca de 200 conselheiristas ainda vivos, perambulando pelo Arraial destruído.
No dia 05 de outubro estava terminada a Guerra de Canudos.
Dois dias depois, o Exército Brasileiro, composto por quase nove mil homens,
ocupou o que restava de daquele Arraial de fanáticos religiosos e executou a
todos os sobreviventes ali encontrados. Morreram mais de 25 mil dos que
habitavam Canudos. Escaparam do trucidamento apenas os que conseguiram fugir.
Por ordem do general Arthur Oscar, soldados desenterraram o corpo de Antônio
Conselheiro e atearam fogo até às cinzas. Segundo o historiador, Eduardo Bueno,
foi esse o mais sanguinário e inglorioso episódio bélico do Brasil.
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