Por Domingos Sávio
Maximiano Roberto
Brigas para inglês ver
As famílias Diniz e Pereira, em Princesa, desde 1930, são
antagônicas na política eleitoral. Antônio Nominando Diniz e Aloysio Pereira
Lima – dois dos principais antagonistas nessa disputa -, ambos foram deputados
estaduais por várias legislaturas e, via de regra, nas campanhas eleitorais, se
digladiavam nos palanques quando pronunciavam discursos contundentes e
ofensivos, um contra o outro. O primeiro, intelectual refinado e dono de verve
fácil, conduzia seus ataques de forma mais polida, nas entrelinhas de suas
falas. Aloysio Pereira, sanguíneo que era, distribuía suas ofensas com mais
contundência, inclusive, contidas de impropérios. Porém, quando as conveniências políticas o
exigiam, os dois se postavam lado-a-lado em defesa de uma candidatura comum,
estabelecendo uma trégua na contenda eleitoral.
Essas circunstanciais uniões aconteceram várias vezes. A
primeira, foi em 1950 quando, ambos os chefes políticos, perfilaram-se juntos
em defesa da candidatura do ministro José Américo de Almeida ao governo do
Estado da Paraíba. A situação se apresentou por demais esquisita. Primeiro, pelo
fato de Aloysio apoiar Zé Américo, o algoz de Princesa na guerra de 1930 e,
depois, por estar ao lado de seu figadal inimigo, Antônio Nominando.
Essa esdrúxula união se repetiu em 1972 quando os dois grupos
políticos promoveram uma pacificação na política princesense e apresentaram uma
chapa única para disputar o pleito municipal com Chico Sobreira como candidato
a prefeito e João Pacote a vice. Em 1982, estavam novamente, Aloysio e Antônio,
no mesmo palanque, defendendo a postulação de Wilson Braga ao governo do Estado.
Na eleição para a escolha do presidente da República, em 1989, novamente
juntos, apoiaram a candidatura de Fernando Collor de Mello. Em 1994, uniram-se
de novo em apoio à candidatura de Antônio Mariz ao governo do Estado e, em
1998, ambos apoiaram a reeleição do governador José Targino Maranhão.
No pleito de 1982, por ocasião da campanha eleitoral de
Wilson Braga para governador contra Antônio Mariz, Aloysio e Nominando
apoiaram, conjuntamente, o nome de Wilson Braga. Desta feita, Antônio Nominando
desertou de seu antigo grupo, então liderado pelo ex-governador João Agripino
Filho, e somou junto com Aloysio em benefício da candidatura de Braga. Essa
estranha união, gerou um dos episódios mais hilários da política de Princesa, o
que consideramos engraçado pelo inusitado que ele encerra.
Sem ter onde se arranchar em Princesa, o grupo do então PMDB,
liderado pelo ex-governador João Agripino, procurou Paulo Mariano para que este
emprestasse apoio à candidatura de Antônio Mariz ao governo do Estado e
coordenasse a campanha na região polarizada por Princesa. Paulo aceitou e
marcou um comício na cidade. Escolheram um dia de sábado para a realização do
evento cívico, pois, sem o apoio das duas grandes forças políticas do município
e, temerosos de que houvesse pouca participação popular, fizeram o comício no meio
da feira, na Praça “José Nominando Diniz”, portanto, em frente à casa de
residência da família Nominando.
Participaram do evento, além do candidato Antônio Mariz e seu
vice José Maranhão, o ex-governador João Agripino, Paulo Mariano, Beto Patriota
e outros próceres da campanha marizista em
Princesa. Em seu discurso, João Agripino, enfático e contundente como sempre
foi, em desafio à família Diniz, começou sua fala dizendo achar muito estranho
que Nominando, junto aos “Pereira”, estivesse apoiando Wilson Braga e, num
rompante bateu forte: “Nominando deveria
ter vergonha de estar no mesmo palanque com Aloysio Pereira, deveria honrar as
calças que veste e ter coragem de tomar uma posição”. De portas fechadas,
doutor Antônio, fez ouvidos moucos a essa provocação do ex-governador.
Três dias depois, num comício realizado no sítio Várzea, Aloysio
Pereira, tomou as dores de Nominando e abriu sua fala dizendo: “Não admito que forasteiros venham a
Princesa para denegrir a imagem de um conterrâneo digno. Registro aqui o meu
veemente protesto!”. Causou estranheza a todos essa defesa de Aloysio em
prol de Nominando, uma vez que ambos já haviam trazido vários “forasteiros”
para, em seus palanques, baterem sem pena no adversário conterrâneo. Essa
defesa fazia-se normal apenas porque atendia aos interesses daquele momento,
pois, passada essa campanha, voltaram a se apresentar não somente como
adversários, mas também, como inimigos para assim estimular o antagonismo do
povo, o que alimentava as disputas eleitorais e atendia aos seus interesses
pessoais.
Aloysio Pereira, proprietário da Rádio Princesa, usava os
microfones daquela emissora, num programa dominical intitulado: “Microfone
Aberto”, para bater sem pena nos seus adversários. Bom de briga, disparava sua
metralhadora giratória atingindo a todos, o que lhe rendeu uma hegemonia na
política municipal que durou 18 anos (1982/2000). Mas, tudo era feito como que
para inglês ver. Desgostoso com o então prefeito Assis Maria, no final de 1999,
Aloysio, fez uma fala no rádio que estremeceu as bases de seu grupo político.
Nessa ocasião – mesmo à revelia do pensamento de seu cunhado
e ex-prefeito Gonzaga Bento - o ex-deputado, de forma imprudente, disse as do
fim com o prefeito: “Assis Maria é tão
desmantelado que desmantelou Princesa!” E acrescentou: “Se colocarem chocalho nos ladrões de Princesa, ninguém dorme” Esse
contundente pronunciamento provocou o rompimento entre ambos. No entanto, já
nas eleições de 2000, quando Assis Maria concorria à reeleição, num comício
realizado no dia 26 de agosto daquele ano, Aloysio estava no palanque do
prefeito pedindo desculpas e votos para a reeleição do desafeto: “Assis, me desculpe pelo que lhe reclamei.
Fui injusto! Eu não sabia que a culpa de você não ter realizado mais, foi da
Câmara Municipal que hoje é adversária!” Nem Aloysio ganhou de volta a
simpatia do prefeito, nem Assis ganhou a eleição, o que foi bom para o
ex-deputado, pois, se eleito, Assis Maria poderia ter-se vingado do chefe
político.
Profícuo no trazimento de benefícios para Princesa, Aloysio
Pereira, realçava suas ações sempre com desprezo quanto à atuação do
adversário. Conhecido por não levar desaforo pra casa, sempre começava suas
falas dizendo: “Eu não tenho rabo de
palha!” Eram, os dois, políticos de uma cepa que não existe mais. Em toda a
lide política, tanto Antônio Nominando quanto Aloysio Pereira, jamais foram
acusados de comportamentos que desabonassem suas condutas.
Mesmo contundente em seus pronunciamentos públicos, Aloysio
Pereira, às vezes, falava nas entrelinhas insinuando coisas horríveis que
teriam sido praticadas, nos idos de 1930, por Nominando, o velho. E não perdia
oportunidade em dizer, em alto e bom tom, que doutor Antônio Nominando era
“frouxo” e “preguiçoso”. Diplomata que era, Antonio Nominando, respondia com
metáforas, o que irritava, sobremaneira, Aloysio Pereira.
Bom orador, o polido doutor Antônio, em suas campanhas
eleitorais, pronunciou discursos antológicos e em lugares por demais inusitados,
como o que ele fez na rua do Cabaré de Princesa. Nessa campanha, em que era
candidato a prefeito, em 1968, defendendo a condição das chamadas “mulheres da
vida” em busca dos votos daquela desventurada classe social, perorou:
“Chamam-nas de mulheres de vida
fácil. Porém, quão difícil é entender onde está a facilidade de uma vida,
quando se é obrigado a corromper o santuário do corpo para adquirir o sustento
para a sobrevivência. São, portanto, mulheres de vida difícil, dificílima, que
sofrem o preconceito das elites para, de forma imoral, proporcionar a
moralidade. São mulheres que dormem tarde, como guardas noturnos, velando pela
segurança das famílias de bem.”.
Um segundo discurso de Antônio Nominando, proferido na mesma
campanha eleitoral (1968), foi inspirado por uma carreata promovida pelo
candidato do MDB1, Joaquim Mariano, quando seus eleitores, embriagados,
retornando de um comício realizado no Povoado de São José, passaram pela frente
da casa de Antônio Nominando, gritando: “Vitória! Vitória!” Em comício
realizado no dia seguinte, doutor Antônio respondeu com o seguinte discurso:
“Enganam-se aqueles que proclamam antecipada a vitória de
seus candidatos. O povo de Princesa já decidiu quem será seu próximo
governante. A vitória a que esses desavisados se referiam a gritar, ontem à
noite, perturbando o descanso das pessoas de bem, era a vitória que estava
impregnada em suas cabeças e que, certamente, hoje, estava fazendo mal a seus
fígados, pois, tratava-se de estímulo provocado pelo líquido, que é a alma das
garrafas, produzido pela destilaria de Vitória de Santo Antão. Líquido que lhes
tira o juízo e a capacidade de ver que o vitorioso será o povo, com a
candidatura deste que vos fala, para Prefeito de Princesa!”.
A briga entre os dois chefes políticos não durou até o fim.
Antônio Nominando, falecido aos 79 anos em 2001, morreu ainda intrigado de
Aloysio; este, no entanto, mesmo tendo, em sua longa existência (faleceu aos 94
anos em 24 de maio de 2018), se digladiado ferozmente nos palanques eleitorais
com os da família “Diniz”, em 18 de novembro de 2011, numa demonstração de
civilidade, se confraternizou, na Câmara Municipal de Princesa, com José
Nominando Diniz, filho de seu maior adversário político, Antônio Nominando
Diniz. A briga política que começou em 1930, no mais das vezes, era para inglês
ver, numa prova de que, na atividade política, tudo pode acontecer e nada pode
parecer verdadeiro até que se prove o contrário.
Nenhum comentário:
Postar um comentário