REPÚBLICA DE PRINCESA –
(JOSÉ PEREIRA X JOÃO PESSOA - 1930)
JOAQUIM INOJOSA
O livro República de
Princesa, de autoria do jornalista pernambucano, Joaquim Inojosa de
Andrade, foi lançado, em edição única, em 1980 pela Editora Civilização
Brasileira, no Rio de Janeiro. Obra fundamental – talvez a mais completa sobre
o assunto -, para o conhecimento, em detalhes, da guerra civil ocorrida em
Princesa, na Paraíba, em 1930. É verdade que contida de alguma parcialidade, em
face dos estreitos laços de amizade entre o escritor e o coronel José Pereira
Lima. Mesmo dando ao escrito um tom bastante tendencioso em prol dos chamados
“Libertadores de Princesa”, isso não prejudica a importância da obra, tampouco
sua essencialidade para o entendimento daquele momento histórico e decisivo,
quando a pequena cidade de Princesa se levantou em armas, rebelada contra o
governo da Paraíba, se tornando independente do Estado e se autoproclamando
“Território Livre de Princesa”.
Nesse trabalho literário, Joaquim Inojosa, na sua ótica de
aliado do Coronel, conta a história completa. Mesmo com os vícios inerentes ao
facciosismo, este é o segundo livro (depois da obra de José Gastão Cardoso: Heroica Resistência de Princesa, já resenhado por este Blog), numa sequência de várias publicações
sobre o tema, desde 1930, que pinta um retrato favorável ao movimento sedicioso
de Princesa. Como é praxe prevalecer a história contada pelos vencedores de uma
guerra, nesse caso, em que não houve vencedores nem vencidos, o lançamento dessa
obra fez-se necessário para, além de contar a história por quem foi testemunha
ocular e ativista intelectual daquela Revolta, dirimir dúvidas e trazer à baila
verdades omitidas pelos que escreveram a serviço dos chefes da vitoriosa Revolução
de 1930.
Sem deixar de lado aspecto algum, Inojosa disserta sobre a
efervescência política em que vivia o Brasil naquele ano de 1930, realça as
graves insatisfações políticas geradas pelo novo governo da Paraíba, enfim,
sobre tudo o que possibilitou a ocorrência do conflito. Em detalhes, o autor
discorre sobre a assunção de João Pessoa Cavalcanti de Albuquerque ao governo
da Paraíba, quando em subversão à ordem vigente, agiu em prol do cerceamento do
poder dos coronéis, em especial do coronel José Pereira de Princesa. Consta às
páginas 13 do livro em tela, comentário bastante preconceituoso sobre o
presidente da Paraíba:
“Ao assumir o governo da Paraíba, encontrou
o sobrinho de Epitácio Pessoa (João
Pessoa), um estado em ordem, política e administrativa, apenas perturbado
por alguns problemas de natureza regional, comuns na vida provinciana
brasileira. Com esta situação não se conformou o novo governador, pelo que
tentou imprimir em tudo uma ordem nova, sem medir-lhe as consequências, ditada
pelo seu temperamento contraditório, girando entre o tranquilo e o
intempestivo. Não seria demasiado afirmar que algumas contradições das suas
atitudes, pessoais ou políticas, resultasse, de uma tara familiar, sabido que
um irmão e dois primos legítimos, morreram epilépticos”.
Com relação à importância do evento bélico (a Guerra de
Princesa) e sua determinante contribuição para a eclosão da Revolução de 1930,
o autor afirma:
“Qual a consequência mais importante
da rebeldia de Princesa, para os destinos políticos do Brasil? Surge-nos
imediata a resposta: A Revolução de 1930”.
Na verdade, Joaquim Inojosa era um expertise sobre a insurreição de Princesa e é mais um autor que
escreve sobre aquele conturbado período, que atesta quanto à determinante
contribuição daquele evento bélico para a eclosão do movimento revolucionário
que pôs fim à República Velha. Nesse trabalho, Inojosa, reafirma que as ações
de guerra promovidas pelo coronel José Pereira, foram em concerto com o
presidente da República, Washington Luís, numa demonstração de que havia
interesse do Governo Federal em manter a guerra. Como prova disso, alude o
autor, em detalhes, sobre a proibição, pelo Governo Central, de o presidente
João Pessoa importar armas e munições, enquanto o coronel José Pereira tinha
quase mil homens em armas e com o poder de livre trânsito para adquirir
munições nos grandes centros do país. Por fim, às páginas 22, o autor escreve
sobre os motivos que fizeram culminar com o assassinato do presidente João
Pessoa, pelo advogado João Dantas, numa conjuminância de fatores que, segundo
ele, no mais das vezes, tiveram origem na Guerra de Princesa:
“Embora resultante de um desforço pessoal,
vingança de brios ofendidos, o assassínio tivera as suas origens na guerrilha
sertaneja. As raízes ali estavam: tortura de familiares em Piancó, cuja invasão
(de Teixeira) fora confiada a um
tenente da polícia ‘figadal inimigo’ de João Dantas; a expulsão deste da
capital paraibana, onde residia e advogava; o arrombamento do seu cofre
particular com a publicação da correspondência mais íntima; levando tudo isto
João Dantas a duas decisões pessoais: colaborar intensamente com José Pereira
na reação sertaneja contra os desmandos do presidente João Pessoa, e ajustar
contas com este no primeiro encontro, o que aconteceu numa casa de chá do
Recife, quando então o roble tombou para sempre”. “(...) até que se completasse
em breve a sequência natural: Princesa + Confeitaria Glória = Revolução de 30”.
Ao longo das 329 páginas do livro, Inojosa disserta sobre a
“Guerra Tributária”; “O Rompimento”; “O Território Livre de Princesa”; “A
Luta”; “As duas Tragédias”. No último capítulo, um documentário onde o autor apresenta
limitada iconografia e farto material informativo, tanto sobre a guerra civil
(telegramas, cartas, artigos de jornais, etc.), quanto referente à Revolução de
1930. Na qualidade de então genro do industrial pernambucano, João Pessoa de
Queiroz, que era primo e inimigo do presidente paraibano, Inojosa funcionou,
durante a guerra, como importante auxiliar do coronel José Pereira, e foi o
redator do Decreto que criou o “Território Livre de Princesa”.
Joaquim Inojosa de Andrade nasceu em 27 de março de 1901, na
antiga vila de São Vicente, município de Timbaúba, estado de Pernambuco, hoje
cidade de São Vicente Férrer, filho de João Inojosa de Albuquerque Andrade Lima
e de Ninfa Pessoa de Albuquerque Vasconcelos. Formado advogado pela Faculdade
de Direito do Recife (1923), estreou no jornalismo em 1917 e foi nomeado
Promotor Público do Recife em 1923. Além deste livro, publicou quase trinta
outras obras. Visitou São Paulo onde conheceu os promotores da “Semana de Arte
Moderna” e trouxe para o Nordeste aquele movimento lítero-cultural, chegando ao
ponto de influenciar intelectuais princesenses, na década de 1920, a fundarem,
em Princesa, o “Grêmio Literário Joaquim Inojosa”, tornando-se Princesa, a
única cidade do interior do Nordeste a aderir àquele importante movimento
cultural.
Sobre o autor, assinalou a Editora Civilização Brasileira:
“Tendo observado e até mesmo
co-participado dos episódios de 1930 nas lutas que se travaram entre o líder
sertanejo José Pereira e o Presidente da Paraíba João Pessoa, consideradas hoje
em dia a causa mais próxima da revolução de 3 de outubro, presta neste livro República de Princesa vivo e amplo
depoimento de tudo quanto pôde anotar, como valioso subsídio para os
historiadores daqueles distantes acontecimentos”.
Sobre o livro, disse o crítico literário paraibano e
professor de literatura da UFPB, Francelino Soares de Souza:
“(...) é obra de fundamental
importância para os estudiosos dos fatos ocorridos então”.
É claro que essa resenha apenas aponta como guia para o conhecimento
da história, uma vez que a concisão deste escrito não descortina a amplitude da
obra. O livro de Joaquim Inojosa é, portanto, leitura obrigatória para aqueles
que desejam conhecer a história de Princesa e partes importantes da história da
Paraíba e do Brasil.
DSMR, em 30 de dezembro de 2020.